Gregório José
Os números são alarmantes. Entre 2020 e 2023, os casos de violência contra idosos no Brasil aumentaram drasticamente, com um crescimento de quase 50 mil casos em 2023, comparado ao ano anterior. As denúncias registradas no banco de dados do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania revelam uma realidade sombria: a maioria dos suspeitos em casos de agressões contra idosos são os próprios filhos das vítimas. Em 2020, quase 48% dos registros envolviam filhos como agressores; em 2023, esse número ultrapassou 56%.
Esta informação, parte de um estudo realizado por pesquisadoras da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), expõe uma ferida social que deve ser tratada com urgência. No Brasil, onde a cultura de respeito aos mais velhos é tradicionalmente valorizada, o aumento da violência contra idosos é um reflexo perturbador de falhas graves no tecido social e nas políticas públicas.
O Sudeste concentra 53% das mais de 400 mil denúncias feitas entre 2020 e 2023, indicando uma prevalência significativa desta crise em uma região considerada mais desenvolvida economicamente. Esse dado sugere que a violência não está necessariamente ligada à pobreza ou à falta de recursos, mas pode estar enraizada em problemas familiares e culturais profundos.
Outro fator é que, no Nordeste e Norte brasileiro, ainda há uma valorização e respeito aos patriarcas. Talvez por questões sociais, talvez por educação. Devemos lembrar, no entanto, que na região sudeste e sul do Brasil se concentram a maioria de pessoas com ensino médio e graduação, bem a mais do que os Estados do Nordeste e Norte brasileiro.
Além disso, a situação é ainda mais crítica para os idosos acima de 80 anos, que representam 34% dos casos registrados em 2023. A vulnerabilidade aumenta com a idade, e esses números reforçam a necessidade de políticas específicas para a proteção dos idosos mais frágeis.
Preocupante também é a questão da subnotificação, especialmente entre idosos com maior escolaridade e renda. A professora Alessandra Camacho, da UFF, destaca que, muitas vezes, esses idosos não denunciam as agressões por constrangimento ou medo de represálias, o que mascara a real extensão do problema. A subnotificação impede que os dados reflitam fielmente a realidade, dificultando a criação de políticas públicas eficazes.
A violência contra a mulher idosa é outro aspecto crucial. Em 2022, 67% das denúncias de violência contra idosos envolviam mulheres. Este dado reforça a necessidade de uma abordagem interseccional que reconheça as múltiplas camadas de vulnerabilidade enfrentadas pelas mulheres idosas.
A falta de informação completa nos registros, com 73% dos casos em 2023 carecendo de dados essenciais como idade e renda, limita a capacidade de análise socioeconômica das ocorrências. Esta lacuna dificulta a formulação de estratégias eficazes para combater a violência e apoiar as vítimas.
É fundamental que o governo e a sociedade como um todo se mobilizem para enfrentar esta crise. A pesquisa da UFF e UERJ e a cartilha educativa lançada são passos importantes para conscientizar a população e orientar ações futuras. No entanto, é necessário ir além da conscientização. Devem-se implementar e reforçar políticas públicas que protejam os idosos, promovam a denúncia segura e garantam o acolhimento adequado às vítimas.
A violência contra os idosos não é apenas um problema individual ou familiar; é um sintoma de uma sociedade que falha em cuidar de seus membros mais vulneráveis. Precisamos, urgentemente, de uma mudança de paradigma que reconheça e responda a esta crise com a seriedade e a compaixão que ela merece. A proteção dos nossos idosos deve ser uma prioridade inegociável, refletindo nosso compromisso com a justiça e a dignidade para todos.
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Gregório José, jornalista, radialista, filósofo