Por que Jesus se recusou a condenar  o pagamento do tributo a César?

Alvaro Vargas

Os judeus, ao adotarem uma crença monoteísta, distanciavam-se dos demais povos, e embora fossem fraternos entre si, mantinham um exclusivismo em relação aos “gentios”. Para eles, era particularmente penoso estarem subjugados ao império romano, principalmente pelo fato de se considerarem o “povo eleito” de Deus. Manifestavam constantemente o repúdio ao pagamento dos tributos aos romanos e odiavam os seus coletores (publicanos). Por isso, os rabinos do templo elaboraram uma cilada para Jesus, na qual poderia ser acusado de conspiração contra o império, caso condenasse o pagamento do tributo, ou se concordasse, ficaria contra a opinião pública judaica. Assim, lhe perguntaram: “é lícito pagar o tributo a César, ou não? Jesus, porém, conhecendo a sua malícia, disse: por que me experimentais, hipócritas? Mostrai-me a moeda do tributo. E eles lhe apresentaram um dinheiro. E ele diz-lhes: de quem é esta efígie, e esta inscrição? Dizem-lhe eles: de César. Então ele lhes disse: dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus. E eles, ouvindo isto, maravilharam-se, e, deixando-o, se retiraram” (Mateus 22:17-22). Evidentemente, Jesus não poderia tomar partido numa questão da política local, acirrando ainda mais os ânimos da população, pois, a sua missão, não era a de enfrentar o império romano, mas nos legar os seus ensinamentos, a fim de vivenciá-los e superarmos o ciclo doloroso das reencarnações de provas e expiações.

Na opinião de Herculano Pires (Revisão do Cristianismo, cap. VII), a situação naquela época estava demasiadamente tensa e perigosa, e até hoje a maioria não percebeu a grandeza da resposta de Jesus, que fez calar a malícia dos interpelantes. Veem nela somente o que não existiu: a manobra astuciosa para safar-se de uma dificuldade. De fato, Jesus sabia que pela sua rebeldia e belicosidade, os judeus eventualmente iriam confrontar o império romano, e isto lhes traria sérias consequências, conforme profetizou sobre a destruição do grande templo judaico (Mateus, 24:2). Isso de fato ocorreu no ano 70 da era cristã. Mesmo Judas, não escapou dessas influências políticas, conforme o seu depoimento, quando já redimido de suas faltas, foi entrevistado no mundo espiritual por Humberto de Campos (XAVIER, F. C. Crônicas de Além-túmulo, cap. 5). Ele citou que “acima dos corações, eu via a política, única arma com a qual poderia triunfar e Jesus não obteria nenhuma vitória. Com as suas teorias, nunca poderia conquistar as rédeas do poder, já que, no seu manto e pobre, se sentia possuído de um santo horror à propriedade. Planejei então uma revolta surda como se projeta hoje em dia na Terra a queda de um chefe de Estado. O Mestre passaria a um plano secundário e eu arranjaria colaboradores para uma obra vasta e enérgica”.

Realmente, apenas Jesus teria a capacidade de implementar a sua Boa Nova, tendo em vista o panorama político e social com o qual conviveu. Segundo Herculano Pires (obra citada), “O episódio da moeda romana esclarece a posição de Jesus diante do mundo. Ele enfrentava os problemas do mundo como um homem do seu tempo, mas dotado de uma visão mais profunda e mais ampla que os demais. Era um judeu integrado na raça, engajado na luta pelos direitos do povo, contra o sacerdócio traidor e os potentados traidores, mas não se limitava a sua visão à Judeia, abrangia nela todos os povos e todas as raças da Terra. Seu objetivo era a libertação do Homem, não dos homens desta ou daquela nação, desta ou daquela raça. Por isso falava às almas encarnadas, despertando-as na carne, e não às encarnações de almas que, em geral, se perdiam na atração dos interesses imediatistas da vida material. Difícil posição que exige um equilíbrio perfeito do espírito, um senso agudo da realidade imediata em sua relação dinâmica, não raro contraditória com a realidade absoluta”.

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Alvaro Vargas, engenheiro agrônomo-Ph.D., presidente da USE-Piracicaba, palestrante espírita

 

 

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