José Maria Teixeira
Será? Espera e acredita-se que assim não seja. Isso seria altamente decepcionante, preocupante e vergonhoso para a Nação brasileira que tem e se orgulha daquela Instituição pelos seus feitos no contexto mundial das universidades.
Para lá, acorrem estudantes, pesquisadores personalidades da ciência, pode-se dizer de todo mundo em busca da produção diferenciada daqueles campos. Os fatos que vêm ocorrendo de negar as declarações dos que se declaram “ppis”, isto é, pretos, pardos e indígenas e, portanto, com direito a ocupar espaço como alunos cotistas raciais naquela instituição, padecem de explicação. Eles causam espécie. Mesmo porque se assim for são reveladores de que a instituição está ainda amarrada ao perfil do projeto que a criou nos anos de 1934.
A pesquisadora Viviane Angélica diz: “Quem escreve o projeto de fundação da Universidade está bem informado que a evolução e a prosperidade do futuro está completamente vinculada à ideia de branquitude, de brancura”, afirma Viviane Angélica. Com o intuito de analisar a falta de docentes negros e de políticas que aumentem sua inclusão na Universidade de São Paulo, Viviane se propôs a traçar um perfil étnico-racial dos professores, de forma a tornar evidente que o projeto da USP desde a sua fundação, é “higienista”. Este termo se refere ao pensamento de Charles Darwin, naturalista britânico que propôs a teoria da evolução biológica por seleção natural.
Neste sentido, é preciso não esquecer que a Nação brasileira é formada por três povos, enquanto dois, o negro e o indígena, há séculos estão à margem desta sociedade e incomodam.
O titulo do artigo, capitães do mato é mais do que alusivo. Lá, no período escravagista, capitães do mato eram negros escravos que, a mando dos senhores de engenho, partiam mata adentro à caça dos negros que, tentando resistir ao sistema escravocrata, fugiam.
Há arrepios e o que reparar nos moldes das comissões de heteroidentificaçao. É esta comissão que na USP confirma a declaração de quem se diz preto, se é preto mesmo, de quem se diz pardo se é pardo mesmo, de quem se diz indígena se é indígena mesmo. Até porque casos de declarações de “ppis” pretos, pardos e indígenas negadas cujos declarantes recorreram à Justiça e obtiveram ganho de causa sendo a Universidade obrigada a reconhecer e acolhê-los em suas fileiras os, até então, recusados pelas bancas heteroidentificação. Assim como não poucos não negros, pardos e indígenas irregularmente aprovados pela mesma comissão foram, já em curso, por denuncia, caçados a bem da justiça.
De 2017 a 2021, foram recebidas 381 denúncias, das quais 193 estão sendo investigadas, 160 foram descartadas e 27 não tiveram andamento, pois os próprios alunos cancelaram a matrícula. No ano passado, houve a invalidação de matrícula de um aluno do Instituto de Relações Internacionais (IRI), por fraude racial e socioeconômica.
Desta forma, guardadas as exceções, pode se entender que as comissões heteroidentificação da USP não estão imunes a prática de verdadeiros capitães do mato caçando negros, pardos e indígenas a caminho da liberdade e da igualdade via educação pelas cotas raciais.
O jornal Folha de São Paulo, caderno cotidiano, 01/03/24, publica: USP cancela matrícula de cotista de medicina e nega que ele é pardo. Trata-se do jovem Alison dos Santos Rodrigues, 18 anos. A Folha publica sua foto. As características físicas a olho nu propiciam uma analise fenotípica com ares de biologia profunda e objetiva que autêntica a autodeclaração. Ele é, pois, um afrodescendente.
Decepcionado com a decisão negativa da comissão examinadora, porém, cônscio de sua natureza étnica e do direito que lhe assiste como cidadão da negritude pela Lei de cotas, apelou para a mesma comissão. A resposta mais uma vez negativa e com certo desdém segundo a reportagem. Não se sabe se houve apelação à Justiça. E se por certo lhe valerá.
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José Maria Teixeira, professor.