Adelino Francisco de Oliveira
A sociedade brasileira historicamente carrega ainda múltiplos e complexos desafios. Tornar-se uma sociedade de fato democrática talvez seja o maior de todos. Importante frisar que, para além da dinâmica eleitoral, democracia pressupõe, sobretudo, justiça social e ambiental. O país traz o peso de tantas injustiças, perpetuadas na realidade de pobreza que assola a vida de milhares de brasileiros, demarcando a negação dos direitos de cidadania mais básicos.
O racismo estrutural, a homofobia, o racismo ambiental, a misoginia, o racismo religioso e tantas outras formas de opressão, exploração, violência e preconceitos delineiam o contexto de uma democracia fragilizada pela constante ameaça de uma cultura que insiste em exaltar e reverenciar o neofascismo. A democracia precisa passar a fazer sentido real para a população, evidenciando que é a base imprescindível para uma sociedade livre, justa e solidária.
O Partido dos Trabalhadores é a melhor síntese do vasto movimento social que se levantou no Brasil, reivindicando por democracia real, alicerçada em uma ampla e intensa participação popular. O PT nasceu como um autêntico partido de massa, sendo resultado da organização política da classe trabalhadora. Suas origens devem ser buscadas no operariado protagonista da luta sindical; na articulação de intelectuais marxistas e na relação entre fé e política dinamizada pelas Comunidades Eclesiais de Base, sob a inspiração da Teologia da Libertação. Eu mesmo conheci o PT em minha juventude, quando participava do Crisma, na Comunidade Maria Mãe da Igreja, no Parque Brasil, região do Grajaú, na cidade de São Paulo.
Há 44 anos o PT surgia, no contexto do processo de redemocratização do país, como um partido de massa, um instrumento de luta da classe trabalhadora. Contrapondo-se ao modelo de partido de quadros, que tem seus donos, o PT despontou como um partido popular, tendo os próprios trabalhadores como os grandes protagonistas da luta por direitos de cidadania. A criação de um Partido popular foi fundamental para que a classe trabalhadora também passasse a disputar as esferas de poder, que historicamente sempre estiveram nas mãos das classes dominantes.
Mesmo chegando aos seus 44 anos, a jornada de construção do PT não está finalizada. Esta instituição está na e para a história, sujeita aos fluxos e à reinvenção, com a necessidade de fortalecer novas lideranças, fazer o chamamento aos mais jovens e sonhadores. O espírito primeiro do Partido, ainda que da dureza da luta, é a ternura e o reconhecimento das utopias. Sua inspiração é o socialismo; seu caminho é a construção da participação popular; seu legado é a superação das apatias e dos medos; seu futuro está na consolidação de uma democracia de alta intensidade, capaz de superar todas as formas de opressão e exploração.
A crise da democracia que o Brasil enfrenta não deixa de ser também resultado da desfiguração dos partidos políticos, ao serem reduzidos ao espectro de partidos de quadros, tornando-se meros reprodutores da ideologia dominante. Nesse cenário conjuntural, o Partido dos Trabalhadores guarda uma dupla tarefa política: reinventar-se como partido de massa, avançando em sua democracia interna e apontar caminhos para que a sociedade possa construir uma democracia real, uma democracia com plena participação popular, alicerçada na produção da justiça social e ambiental.
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Adelino Francisco de Oliveira, professor no Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba; Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião;