Direitos Humanos e a vida como potência

Adelino Francisco de Oliveira

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em 10 de dezembro de 1948, está completando 75 anos. Apesar do significativo tempo histórico percorrido, ainda há muito o que se construir e conquistar no campo dos direitos fundamentais. Na ausência de justiça social e ambiental, as sociedades continuam sendo marcadas por graves violações no âmbito dos direitos. Sem formação para a cidadania política, muitas pessoas ainda discutem e nutrem dúvidas sobre a relevância dos direitos humanos. Como se não fosse fundamental e até urgente a definição de um código ético de direitos, extensivo, de maneira universal e absoluta, a todas as pessoas e também à natureza.

75 anos é o tempo de uma existência! Mas o longo tempo transcorrido ainda não foi suficiente para se consolidar uma cultura dos direitos humanos. Longe disso, nos últimos anos, especialmente com a ascensão eleitoral de segmentos políticos vinculados à extrema-direita, a percepção que se tem é que as sociedades estão regredindo, ao retomarem e defenderem abertamente concepções marcadamente racistas, preconceituosas e profundamente excludentes. A destruição ambiental, que têm inclusive provocado as graves mudanças climáticas, e paulatinamente tirado as condições para que a vida viceje no planeta, não deixa de ser também reflexo de um modelo de sociedade que, alheia aos direitos humanos, tem destruído todas as formas, expressões e potencialidades de vida.

Nesse cenário, há quem advogue que a era dos direitos já se esgotou. Mas se não há lugar no mundo para o programa dos direitos humanos, então também não há esperança de vida com dignidade para bilhões de pessoas que somente sobrevivem, mediante uma existência limitada por condições de intensa miséria, carente dos meios mínimos para o real desenvolvimento das potencialidades mais profundamente humanas. A derrocada dos direitos humanos representaria o fracasso do próprio projeto civilizatório. Não se pode tomar como aceitável e ético que bilhões de pessoas sejam alijadas do direito de existirem, desperdiçando e anulando toda a potência e beleza que a vida poderia alcançar e ser.

A compreensão de que cada pessoa, na singularidade de sua existência e na liberdade de suas escolhas, projeta-se como portadora de uma dignidade humana inalienável, constitui-se como o ponto fundamental para se reconhecer e assegurar a plenitude dos direitos humanos. A dignidade humana não pode ser reduzida a discursos e concepções meramente abstratas, sem nenhuma materialidade e objetividade. O real reconhecimento de que cada indivíduo manifesta uma dignidade intransponível demanda ações políticas efetivas, que possibilitem o pleno desenvolvimento da pessoa humana. O código de direitos humanos existe para que as pessoas tenham assegurado todas as condições básicas para que a vida se realize em toda sua plenitude, intensidade e esplendor.

A passagem dos 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos não deixa de ser um ponto de tensão, um grito de alerta, mas também um sinal de esperança. A humanidade em seu conjunto precisa assumir a tarefa de fazer dos direitos humanos uma realidade cultural e histórica. As injustiças sociais e ambientais depõem contra a vida, soltando um grito ensurdecedor e as sociedades já sentem o peso e as sequelas de tamanha aflição. A única saída para a vida e para o planeta consiste em abraçar o programa dos direitos humanos, a partir da construção de uma outra sociabilidade, uma nova ética, pautada na solidariedade, na ecologia e na utopia política do socialismo.

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Adelino Francisco de Oliveira, professor do Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba, Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião

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