Ainda sobre a Coleção Lamego

Armando Alexandre dos Santos

 

Prossigamos o tema do último artigo, que expôs, em linhas gerais, a vida de Alberto Lamego e salientou seu empenho para que fosse preservado o precioso acervo que conseguiu acumular durante os anos de permanência na Europa.

Inicialmente, tentou vendê-lo ao Ministério da Educação, que chegou a avaliá-lo. Dizia o “Relatório da Comissão nomeada pelo Ministro da Educação, para avaliar biblioteca e arquivo do Dr. Alberto Lamego”, composto por Mário Behring, Max Fleiuss e Rodolfo Garcia (este último, relator):

“A biblioteca que detidamente examinamos consta de 2688 obras, em 2982 volumes; o arquivo consta de 835 códices manuscritos, fora anexos, quadros e mapas. Tanto as obras impressas como os manuscritos estão em perfeito estado de conservação, com excelentes encadernações. Em geral essas obras são de primeiras edições raras e não poucas desconhecidas dos bibliógrafos (…). Os manuscritos são também em geral originais, na maior parte, ou cópias antigas autenticadas e contêm grande número de informações inéditas de proveito para a História (…) e Geografia do Brasil e de sua literatura, como também, em menor parte, da História e da Literatura portuguesa (…)”.

A Coleção Lamego é composta de uma biblioteca e de um arquivo. A biblioteca, que de si já é uma preciosidade de incalculável valor, contém crônicas, relatos de viajantes estrangeiros que estiveram no Brasil desde seu descobrimento, mais de 400 sermões pregados, nos séculos XVII e XVIII, na Bahia e também em Portugal, alguns deles de raridade tal que nem sequer se encontravam catalogados nas melhores obras de bibliografia brasileira. É muito grande, também, a documentação impressa sobre a Companhia de Jesus, no Brasil e na Índia, e sobre outras ordens religiosas que trabalharam em nosso País.

É também muito ampla a coleção de obras publicadas sobre o Brasil, nos campos da medicina, da mineralogia, da agricultura, do comércio, da vida militar etc. Muitas dessas obras, publicadas na Europa, algumas no Brasil e mesmo na Bahia, como é o caso das produções da tipografia de Manuel Antonio da Silva e Serva.

Os opúsculos diversos foram agrupados na sub-coleção Miscelanea e encadernados em 50 alentados volumes. Eram memórias, peças de teatro, poemas, narrativas de viajantes etc., sobre os mais variados temas, todos relativos ao Brasil e editados nos séculos XVIII e XIX, na quase totalidade em primeiras edições.

Passemos à documentação inédita, que constitui propriamente o Arquivo Lamego. São 4062 manuscritos, reunidos em 835 códices, em 154 volumes, incluindo mapas e plantas. Uma catalogação sistemática desses 4062 manuscritos foi elaborada pelas Profas. Heloísa Liberalli Belotto, Arlinda Rocha Nogueira e Lucy Maffei Hutter. Em 1983, o Instituto de Estudos Brasileiros da USP publicou, em dois alentados volumes, o trabalho dessas três pesquisadoras, sob o título Inventário Analítico dos Manuscritos da Coleção Lamego – obra de grande valor, que facilita extraordinariamente o trabalho de pesquisa. Mais tarde, revisto e ampliado, esse inventário foi reeditado, com um acréscimo referente à iconografia.

Os documentos manuscritos colecionados por Lamego se referem à História do Brasil e à literatura brasileira. Abrangem temas como a administração portuguesa do Brasil dito colonial, a guerra contra os holandeses na Bahia e em Pernambuco, os jesuítas e sua expulsão dos domínios portugueses por Pombal, a correspondência administrativa de autoridades, desde o século XVII até o século XIX. Esses manuscritos estão todos microfilmados, em 23 rolos de microfilmes, com cópias no IEB/USP, na Biblioteca Nacional e em Portugal. Dirigiu os trabalhos da microfilmagem minha amiga Dra. Esther Caldas Bertoletti.

Esse é o material disponível e facilmente acessível no Instituto de Estudos Brasileiros da USP. Repito: como explicar que esse tesouro, há tantos anos ao alcance da mão de qualquer pesquisador, ainda continue relativamente inexplorado?

 

 

 

 

 

Licenciado em História e em Filosofia, doutor na área de Filosofia e Letras, membro da Academia

Portuguesa da História e dos Institutos Históricos e Geográficos do Brasil, de São Paulo e de Piracicaba.

 

 

Frase a destacar: Como explicar que um tesouro há tantos anos ao alcance da mão de qualquer pesquisador, ainda continue relativamente inexplorado?

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima