A Amazônia nasceu sob o signo da controvérsia: era espanhola ou portuguesa? A dificuldade de se localizar a linha do Tratado de Tordesilhas se esgarçou com a união das duas coroas sob Filipe I. No século XVIII o Marquês de Pombal herdou a solução do Tratado de Madrid, a tese do uti possidetis. Ao designar para governar o Estado de Maranhão e Grão-Pará o seu meio-irmão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, o instruiu, em cartas secretas, que seu objetivo maior era assegurar que aquelas terras fossem portuguesas e que sua missão principal era ocupá-las. Ele chegou ao ponto de mandar que as tropas portuguesas que fossem enfrentar as revoltas indígenas se “juntassem” com as índias para que o sangue português ficasse naqueles povos.
A segunda controvérsia era sobre a água: Pinzón, navegando pelas costas brasileiras em janeiro de 1500, encontrou, na foz desmesurada, que fazia doce a água muitas léguas mar adentro. Imediatamente, no costume de invocar nome de santos para os lugares que descobriam, deu logo ao rio o nome de Santa Maria de la Mar Dulce.
Nova controvérsia surgiu quando Orellana desceu de Quito rio abaixo, até o Atlântico. O frei Carvajal, que o acompanhava, registrou a presença da tribo das Amazonas, “muito alvas e altas, com o cabelo muito comprido, entrançado e enrolado na cabeça”, “fazendo tanta guerra como dez índios”. Na imaginação dos que chegavam àquelas novas terras de grandes rios e infinitas e frondosas árvores elas se tornaram as guerreiras das mitologias persa e grega. Teoria nunca contestada, mas também nunca confirmada, porque as amazonas só existiam na imaginação dos viajantes.
Agora, outra controvérsia surgiu século passado, esta envolvendo uma perspectiva de riqueza com que o Brasil há muito sonhara e nunca encontrara: petróleo, que aí não quis ficar em terra, nem em mar raso, mas em profundidades nunca pesquisadas, que os geólogos atuais já estão chamando de pré-sal equatorial, em disputa com o pré-sal do sul do país, que abriu uma nova perspectiva para o Brasil, colocando-o como o sexto país em reserva de hidrocarbonetos.
E ainda agora se abriu mais uma polêmica sobre o Amazonas: se para explorar esse petróleo se precisa de estudo para verificar se essa extração prejudica o meio ambiente e a Amazônia, já superada a disputa de ser pulmão do mundo.
Agora, a Ministra Marina diz que sim, que há prejuízo, que não pode ser prospectado. Já o Ministro de Minas e Energia entende que se pode estudá-lo sem prejudicar o meio ambiente. Enquanto isso o vaticano do Governo nessa área, a AGU – Advocacia-Geral da União, em parecer que acaba de proferir, afirma que não é exigível o processo de licenciamento determinado pelo Ibama para que essas riquezas sejam exploradas pelo Governo.
O Presidente Lula, que, como eu, é sonhador de um Brasil como um dos mais ricos países do mundo futuro, ao ser indagado se era a favor ou contra, respondeu: “Eu também estou sonhando.”
Essas discussões, como todas as controvérsias sobre a Amazônia, vão continuar e, graças a Deus para nós, elas se resolvem com palavras, e não com revoltas do Hezbollah e do Hamas e bombas de Israel, e sem medo da bomba atômica, porque, graças a Deus também, Alfonsín e eu firmamos o Acordo Brasil-Argentina proibindo que esses brinquedos do Diabo, que podem acabar com a Terra, por aqui transitem. E assim fizemos com que a América do Sul se tornasse o único continente do mundo que não possui armas nucleares.
Enquanto isso as amazonas continuam em nossa imaginação: “nuas em pelo, tapadas as suas vergonhas”, andando pela Amazônia com petróleo a dez mil metros de profundidade, esperando por nós, pelas nossas plataformas marítimas, e o Marquês de Pombal, na Eternidade, brindando com vinho do Porto, festejando que aquela região seja brasileira com DNA português.
E continua a controvérsia do nome: o rio que o Padre Vieira chamava das Almazonas é o Amazonas ou o das Amazonas? Com tacape ou sem roupa?