Investigar-se a si próprio

José Renato Nalini

 

A cada mês, são publicados cerca de cinco mil livros no Brasil. Todos escrevem, quase todos publicam. E quem lê? Naufragou a ideia de uma “Pátria de Leitores”. Quem é letrado só tem tempo para escrever e não para ler.

Por isso é importante revisitar a sabedoria que alicerçou o nosso pensamento, até como parâmetro para as leituras que devamos fazer. Um dos filósofos mais instigantes é Heráclito, aquele que disse “ninguém se banha duas vezes nas águas do mesmo rio”. Queria dizer que as águas estão em constante movimento e não seriam as mesmas na segunda vez. Mais importante ainda, nós mudamos a cada banho. A cada instante somos modificados pela apreensão de algo novo, por influência de um pensamento, de uma sensação ou de uma percepção.

Heráclito legou uma lição de grande alcance: “A multiplicação de conhecimentos não proporciona sabedoria”. Os responsáveis pela educação estatal tupiniquim não leram isso. Preocupam-se com inculcar na criança uma verdadeira enciclopédia de informações, treinando sua capacidade mnemônica e se esquecendo de preparar o educando para a vida. Os adolescentes do Ensino Médio percebem isso e praticam o salvífico exercício da evasão. Ninguém aguenta escola chata e desinteressante.

Outro bom ensinamento heraclitiano é o do autoconhecimento. “Investiguei-me a mim próprio”. As pessoas se preocupam com tanta coisa, menos com o conhecimento de suas fragilidades e de suas vulnerabilidades. Deixam de lapidar seus talentos e perdem tempo com insignificâncias e superfluidades.

Quem se preocupar com o caminho da perfectibilidade adquirirá uma sapiência que os eruditos raras vezes alcançam. A vida é muito breve e muito frágil para se perder com trivialidades que em nada nos acrescentam.

Por isso é bom retornar a Heráclito, que inspirou Sócrates, e para quem o verdadeiro progresso é o da vida interior. Tudo começa pelo conhecimento de si próprio e procura desvendar os segredos que não admitimos sequer para nós mesmos, pois “a natureza gosta de ocultar-se”.

Todos temos em nossas mãos e mentes a chave do destino de nossas vidas. Não faz sentido se perder por veredas erráticas, se a psique possui um logos, uma razão que aumenta por si mesmo e que a Inteligência Artificial não conseguirá eliminar, como pensam os temerosos.

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José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras

 

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