Três milhões sem transporte

Dirceu Cardoso Gonçalves

Pelo menos três milhões de paulistanos enfrentaram dificuldades com a greve do metrô, trens e funcionários da Sabesp, ocorrida na terça-feira em protesto aos planos do governo estadual de privatizar aqueles serviços. O direito de greve existe e constitui recurso extremo à disposição dos trabalhadores em defesa dos seus direitos e interesses. No caso, vale lembrar que os realizadores da paralisação buscaram exclusivamente os próprios interesses e ignoraram a grande clientela, que ficou sem transporte para comparecer ao trabalho e realizar as demais atividades na área urbana da capital. Tanto que os próprios trabalhadores decidiram encerrar a parede e, ainda, rejeitar as propostas de voltar ao assunto na próxima semana.
O movimento foi de protesto contra os planos do governador Tarcisio Gomes de Freitas de privatizar as linhas de transporte e a companhia de saneamento. Desnecessário porque esse propósito vem sendo anunciado desde a campanha eleitoral, realizada no ano passado. Daí a conclusão de que a greve foi política e – mais que isso – prejudicial à coletividade. É com esse propósito que o governo quer defini-la como abusiva, o que pode resultar em multas e outras sanções aos seus realizadores. Cabe agora, à Justiça do Trabalho, analisar os enquadramentos legais do movimento e tomar as providências. Uma delas a aplicação de multas aos realizadores que tenham desobedecido às normas legais.
Toda paralisação tem de ser previamente comunicada ao usuário do sistema – para evitar transtornos maiores – e à Justiça do Trabalho, para a sua modulação de acordo com a legislação. Normalmente o tribunal exige a manutenção de um percentural do serviço e isso não costuma ser atendido, gerando multa. Ninguém, no entanto, é informado sobre a efetiva execução dessa penalidade. A idéia que sobra é a de que, por alguma razão ou brecha legal, a sanção não é executada e na greve seguinte as irregularidades voltam a acontecer em prejuízo do usuário dos serviços.
Durante muitos anos, os sindicatos – que se sustentavam através das cotas da contribuição sindical obrigatória a todos os trabalhadores – atuaram como forças político-ideológica. Realizaram greves que penalizavam a população e nem sempre beneficiavam os trabalhadores, mas atendiam a interesses políticos. Isso é inadmissível. Respeite-se o direito de greve mas não se ignore o interesse da comunidade destinatária dos serviços prestados pelas categorias profissionais.
Depois dessa terça-feira difícil, o governo do Estado – alvo da greve – tem o dever de questionar sua legalidade e interesse e os sindicatos que a promoveram precisam ser chamados a dizer de suas razões e, dentro do ordenamento legal, demonstrar não terem descumprido as normas e regulamentos. A esperança da população, a essa altura dos acontecimentos, está na Justiça do Trabalho, única com competência para dirimir as dúvidas e, conforme o apurado, promover as devidas penalizações. Quando todos estiverem cumprindo fielmente as leis, dificilmente a população voltará a sofrer a falta de transporte ou de outros serviços essenciais porque, antes de deflagrados os movimentos paredistas, ocorrerão negociações que coloquem frente a frente os interesses em oposição sem precisar estabelecer o caos para que reivindicações ou negativas sejam ouvidas e levadas em consideração.
A greve é o último dos recursos, aplicável só quando pereceram todas as possibilidades de negociação. Quando é o primeiro, algo está errado e precisa ser enquadrado nos rigores da lei…
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Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves, dirigente da Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo); [email protected]

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