Gilberto Nascimento
Estudo conhecido como ‘Os órfãos da Romênia’ (www.bucharestearlyinterventionproject.org), vem mapeando, desde os anos 2.000, os efeitos da institucionalização precoce no desenvolvimento do cérebro de crianças. O estudo demonstra que crianças abrigadas por tempo prolongado, especialmente durante os primeiros anos de vida, têm déficits cognitivos significativos. Isso inclui diminuição de Q.I., aumento de distúrbios psicológicos, depressão, redução da capacidade linguística, dificuldade de criação de vínculos afetivos, crescimento físico atrofiado, entre inúmeros outros sérios problemas.
Por outro lado, uma análise comparativa, com base em exames que mapeiam o cérebro, mostrou que uma criança retirada de um abrigo ou de uma situação de abusos e maus tratos e levada para uma família funcional, seja adotiva ou acolhedora, pode voltar a se desenvolver normalmente em todos os sentidos.
Segundo dados recentes do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o estado de São Paulo possui 9.542 menores acolhidos em instituições públicas. A maioria vai crescer e permanecer em abrigos até a maioridade. Entretanto, mesmo os melhores serviços de acolhimento institucional não fornecem o que uma criança precisa para seu pleno desenvolvimento – é o que sugere o estudo supracitado.
Para resolver essa questão já temos no país, com todas as regras bem definidas, o Programa de Acolhimento Familiar. Esse programa recruta, capacita, orienta e até remunera (01 salário-mínimo) famílias para acolher crianças e adolescentes em suas casas. Essas são as famílias acolhedoras. Não se trata de adoção. Trata-se de um acolhimento temporário que dura até a criança ser adotada, voltar para a família biológica, ou completar a maioridade.
De acordo com o artigo 34, parágrafo 1, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o acolhimento familiar é prioritário em relação ao acolhimento institucional. Isso significa que quando uma criança é retirada de sua família biológica por qualquer motivo que seja, ao invés de ser enviada para um Serviço de Acolhimento Institucional de Crianças e Adolescentes (SAICAs), ela deveria ser enviada a uma família acolhedora. Infelizmente, não é o acontece, porque não temos um número suficiente dessas famílias.
O Estado de SP possui apenas 213 crianças e adolescentes em famílias acolhedoras, de acordo com o CNJ — enquanto mais de 9 mil estão em abrigos. Precisamos inverter essa proporção se quisermos proteger nossas crianças e cumprir o ECA.
Para melhorar os números do Acolhimento Familiar no Estado de SP, devemos dar mais visibilidade a esta política pública, levando ao conhecimento do grande público, de gestores públicos, de legisladores, profissionais da área, etc. E precisamos de mais recursos para ampliar esse serviço em todas as regiões do estado.
Somos um povo acolhedor e cheio de empatia. Em um estado com cerca de 45 milhões de habitantes, com uma ampla e constante campanha de divulgação, tenho certeza de que conseguiremos sensibilizar centenas de famílias paulistas para acolher esses menores temporariamente, em seu seio familiar, dando-lhes afeto e os cuidados necessários para seu pleno desenvolvimento.
Exatamente por isso estamos articulando a expansão do acolhimento familiar para todo o Estado de SP. Vamos tirar das sombras esse programa que não muda apenas o futuro de nossas crianças e jovens, mas melhora, enriquece e fortalece o tecido social.
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Gilberto Nascimento, secretário estadual de Desenvolvimento Social