As pessoas infectadas pelo vírus HIV convivem, muitas vezes, com o preconceito. E isso não é novidade. Embora o estigma sobre ser portador do vírus tem diminuído ao longo do tempo – e o trabalho de toda sociedade neste sentido é importantíssimo –, ainda há quem ‘feche a cara’, quando o assunto é vírus da imunodeficiência humana. Mas, para além de preconceitos sobre o paciente, há também muitos mitos sobre essa condição.
Uma delas, e que sempre aparece quando estamos fazendo alguma atividade de atendimento, é a questão que envolve as doenças cardiovasculares. Como os médicos costumam delinear: as enfermidades que afetam o coração e o sistema circulatório.
É claro, pacientes com HIV precisam ter cuidados mais específicos do que a população em geral, afinal, o vírus afeta diretamente o sistema imunológico e cria certas fragilidades. É evidente também que é preciso estar sempre atento aos problemas cardiovasculares que podem ser causados por conta desta condição que afeta no mundo, segundos a Unaids – programa da ONU (Organização das Nações Unidas) para acompanhar a epidemia da Aids, 38,4 milhões de pessoas vivem com o vírus. No Brasil, são cerca de 920 mil.
Mas é mais importante buscar informações de qualidade, de pessoas que realmente estudam a condição e estão aptas a demonstrar as diferenças de cada situação, sem cair em ‘achismos’ e, pior ainda, em preconceitos sobre o vírus e seus portadores.
Para auxiliar nesta busca incessante por informações de qualidade, eu trago aqui alguns trechos do artigo escrito pelo médico cardiologista Rafael Kuhnen, graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina, e que está publicado no site da Unicardio — clínica de cardiologia especializada na prevenção, na investigação e no tratamento de doenças do coração desde o período fetal, da infância, da adolescência até a vida adulta.
“Antes de tudo, precisamos entender o que o vírus faz no organismo do paciente infectado. Então, saiba que, basicamente, ele se liga à membrana de uma célula de defesa chamada CD4”, explica Kuhnen. Desta forma, acrescenta o médico, “o sistema imunológico enfraquece e o corpo já não consegue mais lutar contra os patógenos que o invadem, como vírus e bactérias”. Assim, o portador de HIV fica mais suscetível a desenvolver formas graves de infecções que, para não infectados, seriam mais simples de serem tratadas.
MITOS E VERDADES SOBRE O HIV E O CORAÇÃO – Rafael Kuhnen enumera alguns destes mitos e verdades, a começar pelo mais comum: o HIV afeta as artérias? “Verdade! O principal aspecto que explica a relação entre HIV e doenças cardiovasculares é o fato de que o vírus impacta na saúde das artérias, gerando inflamações”, explica. Ele acrescenta, demonstrando que também há maior risco de acúmulo de placas de gordura, por meio do aumento do colesterol ruim (HDL). “Consequentemente, aumentam as chances de infarto do miocárdio, quando essas artérias ficam entupidas e há a interrupção do fluxo de sangue para o coração”, detalha o médico cardiologista.
O melhor é parar com os medicamentos antirretrovirais: mito! “Esse é um grande e perigoso mito! Os medicamentos antirretrovirais, realmente, podem aumentar os níveis de colesterol. No entanto, eles não devem ser interrompidos!”, escreve. “Os remédios são fundamentais para controlar o HIV no organismo, evitando o desenvolvimento da Aids (a doença causada pelo vírus quando já está em estágio avançado)”, explica. E ele conclui: “Alguns pacientes podem até mesmo atingir a fase não detectável, o momento em que a carga viral já está em uma taxa muito baixa e não é mais transmissível.”
HIV também aumenta as chances de desenvolver diabetes: verdade. “Como todo medicamento, os antirretrovirais também geram alguns efeitos colaterais. Um deles é prejudicar a ação da insulina no corpo. Trata-se do hormônio que controla os níveis de glicose na corrente sanguínea. Assim, há o risco de desenvolver diabetes tipo 2.”
Portadores de HIV não conseguem controlar o colesterol: mito. “Já mencionamos que o vírus pode aumentar os níveis de colesterol ruim. Porém, isso não significa que nada possa ser feito. Bons hábitos de vida ajudam a controlar as taxas, como manter uma alimentação saudável, evitar o consumo de comidas gordurosas e praticar exercícios físicos. Nessa lista, também não pode ficar de fora o acompanhamento médico periódico”, conclui Kuhnen.
Doenças cardíacas que podem se desenvolver em portadores de HIV: 1) infarto: interrupção do fluxo de sangue para o coração; 2) arritmia: batimentos cardíacos irregulares; 3) angina: estreitamento das artérias, o que gera dor no peito; 4) insuficiência cardíaca: o coração se enfraquece e não consegue bombear o sangue adequadamente; e 5) miocardite: inflamação do músculo cardíaco.
Paulo Soares, presidente do Caphiv (Centro de Apoio ao HIV/Aids, Sífilis e Hepatites Virais).