José Renato Nalini
O fotógrafo irlandês Richard Mosse estava cansado de fotografar e filmar destruições, primeiro na guerra do Iraque, depois no Congo. Resolveu conceder-se um hiato de harmonia e pensou em fotografar orquídeas na Amazônia. Afinal, a “Hileia Verde” seria um paraíso, repleto de milhares de espécies dessa for tropical tão cobiçada.
Veio para a última grande floresta tropical do planeta e nela permaneceu de 2018 a 2021. O resultado foi uma instalação cinematográfica chamada “Broken Spectre”. Espectro quebrado, seria uma tradução singela de sua obra. É um filme épico, de quatro projeções conjuntas que totalizam vinte e um metros de diâmetro. É o testemunho visual da calamitosa destruição da floresta amazônica. A queima deliberada e criminosa, a derrubada de árvores, a agricultura em escala industrial, a extração mineral e o deslocamento de povos indígenas que os cientistas acreditam estar se aproximando rapidamente de um ponto de inflexão do qual não haverá retorno.
Richard Mosse condoeu-se da sorte desse patrimônio que os brasileiros sequer conhecem, mas que deixam exterminar antes mesmo de saber o que ele significa. “Uma área de setenta e cinco por cento de toda a Amazônia está tão degradada por processos de desmatamento, que estamos muito perto do ponto em que ocorre um perecimento automático e a floresta não pode gerar sua própria chuva. Quando isso ocorre, ela logo se transforma em savana” e, em seguida, em deserto.
O filme é visceral e abstrato, belo e horripilante. Mostra como os indígenas, os verdadeiros donos da terra, estão sendo dizimados por uma série de delitos praticados por humanos sem alma: enfermidades provocadas pelos garimpeiros na ilicitude, expulsão de suas terras, envenenamento de seus rios.
É tamanho o grau e intensidade da tragédia, que não se compreende a leniência do governo brasileiro e dos demais governos, pois a Amazônia inexistente, afetará a vida de todos os habitantes da Terra. A passividade da sociedade humana, não só a brasileira, mas aquela constituída por seres sensíveis, que ainda não perderam de todo a consciência do que significa a natureza. Haverá quem não se comova com a tragédia amazônica? Ou existe algum humano que prefira olhar carvão em vez de orquídea?
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José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras