Alvaro Vargas
Em nossa romagem terrena podem ocorrer situações inesperadas, mesmo sendo previdente e vivendo conforme os padrões morais da época. Tais surpresas são acontecimentos alheios a nossa vontade, como a desencarnação precoce de entes amados, desastres naturais, reveses financeiros, injustiças, traições etc. Nesses episódios, nem sempre conseguimos compreendemos os desígnios divinos (a vontade de Deus), mantendo o necessário equilíbrio emocional. Assim, muitos se vitimizam e revoltam-se contra as adversidades enfrentadas, chegando mesmo a duvidar da existência e da proteção do Altíssimo. Lastimavelmente, as religiões institucionalizadas, presas a dogmas arcaicos, baseados em uma fé fanatizada, não permitem, eficientemente, a construção de uma resignação cristã nessas situações.
Entretanto, embora exista injustiça na Terra, não existem injustiçados. É fundamental fortalecer a nossa fé no Criador. Conforme Allan Kardec (O Livro dos Espíritos, questão no. 4), “para crer-se em Deus, basta se lance o olhar sobre as obras da Criação. O Universo existe, logo tem uma causa. Duvidar da existência de Deus é negar que todo efeito tem uma causa e concluir que o nada pode realizar alguma coisa.” O acaso não existe no universo e nada acontece sem a permissão divina. Para isso, Jesus nos assegura que “até os fios dos nossos cabelos estão contados” (Lucas, 12:7). Sendo Deus soberanamente bom e justo, a suprema inteligência (atributos da divindade), Ele não pode cometer equívocos nos atos das nossas vidas, caso contrário, não seria Deus. O Espírito Benedita Maria (TEIXEIRA, R. Ações corajosas para viver em paz, cap. 21) nos assevera que “mesmo que não possamos ver nem compreender, amplamente, a Divindade, sabemos que ela existe. Nessa certeza, está estruturada a nossa fé em Deus, resultado da harmonia entre o saber e o sentir”.
Felizmente, desde o advento da Terceira Revelação, marcada pela publicação de O Livro dos Espíritos em 1857, o Consolador prometido por Jesus (João, 14:15 -17 e 26), o Espiritismo, ficou estabelecido novos dogmas, com base na ciência, confirmando a preexistência da alma e prescrevendo a fé raciocinada. A reencarnação representa o perdão divino às nossas faltas e a oportunidade de recomeço. Não existe um inferno eterno, nem um paraíso contemplativo. Somos compelidos a inúmeras reencarnações visando burilar as nossas almas até a perfeição, como espíritos puros. Contudo, cada etapa evolutiva apresenta as experiências educativas, conforme a nossa capacidade de aprendizado, pois, os desígnios de Deus são pautados na Sua Lei de amor, a fim de vencermos as nossas limitações morais e intelectuais. Assim, gradativamente, através das inúmeras migrações da alma, exercitamos a prática do bem e da caridade, desenvolvendo a fraternidade universal e criando laços de amor que se manterão ao longo da eternidade. Contudo, devido às nossas imperfeições morais, quanto submetidos às experiências reencarnatórias na escola terrena, é comum cometermos iniquidades. Nessas ações pouco edificantes, embora não sejamos culpados, somos os responsáveis pelas reações adversas advindas de nossa imprevidência. Conforme o apóstolo Paulo (Gálatas, 6:7-8), “tudo o que o homem semear, isso também ceifará”. Isso esclarece que as experiências dolorosas que vivenciamos podem estar relacionadas com as nossas existências pregressas, ou com os resultados de ações pouco edificantes perpetradas ainda nesta reencarnação.
Tenhamos Jesus como referência, em sua resignação perante os desígnios divinos. Já na etapa final de seu messianato, quando se encontrava na Judeia, atendendo ao pedido dos apóstolos sobre como orar, apresentou uma grande lição sobre a confiança em Deus, dizendo: “Que seja feita a Sua vontade, tanto na Terra quanto nos céus” (Mateus, 6:10). E, na cruz, injustiçado e mesmo abandonado por quase todos, humildemente apenas suplicou: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem” (Lucas, 23:34).
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Alvaro Vargas, engenheiro agrônomo-Ph.D., presidente da USE-Piracicaba, palestrante espírita