A mentira e outras verdades

 

Camilo Irineu Quartarollo

 

Nesses dias a mídia circulou notícias sobre grupos de uma igreja na África, submissas a um pastor de lá, tais pessoas em jejum total para encontrar Jesus, ou seja, foram induzidas ao suicídio travestido de ato religioso. Geralmente, as pessoas delegam suas opiniões a quem as faça mais verossímeis, como a um pastor, padre ou políticos, os quais pensam e influem nos liderados. A mentira surrupia as roupas da verdade, cujas vestes são transparentes e compridas, para os tropeços das pernas curtas da mentira.

No Brasil, repetem-se que os juros do Banco Central, de 13,75%, é a ‘única arma’ para evitar a inflação brasileira – não haveria outra opção! O presidente do BC, caudatário da corrente monetarista faz defesa burra de tese semelhante, impondo goela abaixo a maior taxa de juros do mundo. Em vão, contraditam essa postura autocrática economistas como o Nobel Joseph Stiglitz e o pai do Plano Real André Lara Resende. O presidente do BC na analogia dos juros propõe esse ‘antibiótico’ de uso continuado para conter a inflação. Antibiótico?! O tecnocrata disse ainda que deveria ser maior a dose! Os antibióticos são uma verdade para infecções, mas não para processos econômicos. E, se assim mal comparado, a inflação seria um processo inflamatório, e não necessariamente a infecção, se combateria com anti-inflamatórios, não com antibióticos deletérios.

As ambiguidades podem vir ainda pelos ‘jabutis’, espécime longe da extinção e bem alimentado com uma dieta rica em vírgulas, pontos e orações subordinativas condicionais ou concessivas – são textos inseridos num projeto de lei à revelia do assunto próprio. Quando aparece o jabuti, logo se tenta esconder o bichinho por uma oratória patética em favor da “coletividade”, mas cuja brecha é de interesse de grupos do lobista.

A auto ilusão é uma aliada indispensável da mentira. Mesmo involuntariamente, pode-se induzir pessoas suscetíveis. Se alguém saltar com o paraquedas de um avião a dois mil metros de altura voará por quinze minutos. Contudo, se saltar de um avião a dois mil metros, e sem paraquedas, voará até o fim da sua vida. Podemos nos sentir pássaros, mas asas não as temos.

Alguns líderes sabem que o povo vai anuir suas mentiras convenientes, direcionando a outrem o ódio, e de forma sensacionalista para monetizar. O Chacrinha buzina bem: eu vim para confundir, não para explicar.

O que se fala não se escreve, o que se escreve não se lê.

As versões estapafúrdias são meios de protelar historicamente verdades inconvenientes. Os políticos e fazendeiros do Brasil protelaram a Abolição dos escravizados, traficando humanos como se fossem nascidos aqui e não-livres, para exploração do seu trabalho e conhecimentos. Após a Abolição, usaram de meios protelatórios para dominação continuada, como a Lei de terras, da vadiagem e outras, para segregar.

 

Camilo Irineu Quartarollo, escrevente e escritor, ensaísta, autor de crônicas, historietas, artigos e livros

 

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