O que está em jogo nessa eleição

Edmir Simões Moita

 

É preocupante o número de pessoas que me cercam e que encaram a próxima eleição como um pleito normal. Escrevo este texto dirigido a essas pessoas.  Não entenderam que, definitivamente, não é uma disputa entre várias correntes políticas no jogo democrático. É também, mas, principalmente, um plebiscito entre, de um lado, barbárie e fascismo, e de outro, democracia e consolidação do avanço civilizatório.  Bolsonaro surgiu na política brasileira com uma missão clara, articulada com a extrema direita internacional – destruir a democracia brasileira. E a missão de todos os democratas que tiverem consciência do risco que corremos é barrar o seu avanço, assim como foi feito em vários países do mundo, onde conservadores e a esquerda se uniram para barrar o avanço do fascismo.

O esquema de penetração foi o tradicional do fascismo: criação de uma poderosa máquina de propaganda do partido, baseada em três pilares – descrédito da imprensa tradicional, uso da mentira e distorção dos fatos ilimitadamente e a propagação de ódio a grupos estrategicamente escolhidos. Na Alemanha nazista, Hitler acusava a imprensa de dominada pelos judeus e comunistas e cunhou a máxima “uma mentira contada mil vezes, vira verdade”. No Brasil de Bolsonaro, a grande imprensa foi acusada de petista e “esquerdopata” e as redes sociais passaram a disseminar arrasadoramente, com método e alta tecnologia repassados pela extrema direita americana, mentiras e distorção de fatos impulsionando uma enorme rede de seguidores ingênuos e manipulados, tendo como centro de divulgação o Gabinete do Ódio.  A sofisticação do uso das redes digitais deu às milicias bolsonaristas um enorme poder de penetração. Contrapondo-se aos fatos do desastroso Governo Bolsonaro, tais milícias digitais construíram uma imagem completamente falsa do país, a qual repassam com técnica refinada para a massa bolsonarista, que acredita que vive num país que dá certo. Mais uma característica do fascismo – a mitificação do líder e a mistificação da realidade, com a venda da ilusão de um futuro grandioso. Com isso, conseguiram transformar um mau soldado, forçado a sair do Exército, e deputado folclórico por 28 anos, famoso pela ignorância, grosseria e intervenções descabidas, em um grande líder, que chamam de Mito.

Sem um projeto de Governo, seu grande teste como condutor do país, na crise da pandemia, onde mostrou toda sua inépcia e obscurantismo, foi um desastre total, com milhares de mortes atribuídas à sua liderança errática. Seu único projeto é instaurar um regime autocrático. Pequeno trecho de entrevista concedida em 23 de maio de 1999 mostra isso: “Pergunta: se fosse presidente, o senhor fecharia a Congresso? R: Daria golpe no mesmo dia…O país só vai mudar…matando 30 mil, começando com FHC”. Além disso, a organização de manifestações sempre antidemocráticas: ataques ao STF, discursos em frente ao QG do Exército, Sete de Setembro de ameaças, desfile de tanques para intimidar o Congresso, etc. Além de uma ridícula imitação de Trump, questionando a confiabilidade do resultado das eleições.  Lá, a confiabilidade do voto pelo Correio, aqui as urnas eletrônicas.

Mas, o pior de tudo, como todo fascista, ele adora o uso da violência na política, o uso de armas, a força como argumento supremo, os motins de polícias, as milícias armadas. Tem incentivado isso o tempo todo. Quando se junta a isso a demonização do adversário, o que é constante, temos o caldo de cultura para conflitos armados.

O que justifica alguém ainda considerar essa escolha sinistra como possível? Vamos ver algumas justificativas correntes, sobre as quais me pronuncio: “Sou contra o PT e a esquerda. A visão deles sobre o funcionamento da economia é atrasada e o intervencionismo suga o vigor da economia”.

Concordo plenamente. Sou filiado ao PSDB desde a sua fundação e sempre me posicionei contra o PT, assim como os quadros históricos do partido, como Mário Covas, FHC, Serra e outros, que sempre foram adversários do PT, mas que sempre souberam que, quando a democracia está em jogo, temos que nos aliar a quem a defende. As questões programáticas devem ser combatidas com vigor.  Por óbvio, no jogo democrático, onde não há lugar para fascistas. Como disse o Dória: “O Lula é adversário, Bolsonaro é inimigo”. “Sou conservador como o Bolsonaro”.

Bolsonaro não é conservador. É um extremista de direita atrasado. Porta-voz do conservadorismo brasileiro é o Estadão, que todos os dias, em seus editoriais, critica   os desastres da administração Bolsonaro e o considera explicitamente como o pior presidente que o Brasil já teve, cujas atitudes causam asco (expressão do Estadão). “Lula é ladrão e o PT é um partido corrupto”.

No presidencialismo de coalizão que temos, nenhum presidente conseguiu governar sem acordos pouco republicanos com o Centrão. Mensalão, Petrolão e Orçamento Secreto são manifestações dessa situação, assim como várias concessões feitas ao Centrão na Constituinte de 1988.

Lula, em um julgamento depois anulado por suspeição de parcialidade do juiz, foi condenado por causa de um triplex minúsculo em Guarujá, no qual nunca morou e nem nunca esteve em seu nome. Teve possibilidade de prisão domiciliar, que ele não aceitou. Hoje, diante da Lei, não é culpado de nada, assim como Bolsonaro, que ainda carrega o ônus de explicar onde arrumou 26 milhões de reais em dinheiro vivo para comprar 51 imóveis.

Para terminar, para todos que odeiam o PT, lembro uma famosa frase de Churchill, que odiava o comunismo e Stalin, mas a ele se aliou quando Hitler invadiu a União Soviética: ”Se Hitler invadisse o inferno, eu me aliaria ao capeta”.

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Edmir Simões Moita, físico graduado pela USP; Pós Graduado em Economia pela Unicamp, economista aposentado do IPEA

 

 

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