Deboches à nação

O deputado Daniel Silveira ganhou a medalha Ordem do Mérito do Livro, da Biblioteca Nacional. Puro deboche, claro. Hoje para seragraciado não precisa de mérito, basta um amigo no governo e, no caso, um amigo presidente. Ora, o deputado é famoso pela truculência e graça de Bolsonaro. Qual contribuição literária dele?!Gil ainda encanta com suas letras musicais, a notável atriz Fernanda Montenegro escreveu alguns livros pouco conhecidos antes do ingresso majestoso na ABL conduzida pelo comentarista global Merval Pereira. Enquanto isso pouco se lê, se conhece e se aplica em escrever corretamente e com simplicidade, achando-se que o leitor é obrigado a “entender”.

Não me assustaria se algum figurão sem letras se apropriasse do “Prêmio Jabuti” de literatura. Os falsos mitos querem se sobrepor à Inteligência e Cortesia brasileira. Afrontam inclusive a literatura universal, culturas ancestrais, escritos trabalhosos da tradição, ocultados e guardados em rolos, testemunhos perenes.

Ao passear pelas margens do ribeirão Piracicamirim que imbrica na gloriosa Esalq verá jabutis nadando, aquecendo-se nas pedras. Entretanto, pode andar o dia inteiro pelointerior verde da Agronomia e não vai flagrar nenhum jabuti trepado em árvores, exceto se alguém o puser lá.No tempo do deputadoUlysses Guimarães já se dizia que jabuti não sobe em árvore e, se lá estiver, foi enchente ou mão de gente.No jargão político os jabutis são objetos estranhos ao projeto principal, subidos e agarradoscomo a preguiça na árvore da Lei, mas para os retirar, ufa… Servem para isentar acionistas de impostos, criar algum privilégio oculto e impor custos sociais. Será que essa honraria ao deputado não é um “Prêmio Jabuti” disfarçado?O deboche ainda não chegou ao dito Prêmio.

Desde o movimento abolicionista se debocham do povo, primeiro dos negros, afrodescendentes e de todos os pobres. A lei do ventre livre era um escárnio, pois filhos de escravizados iam ser livres como? A do sexagenário obrigava a que os idosos cativos, se chegassem aos sessenta anos, ainda servissem o patrão para não morrer de fome. Dirão então, ah, a Lei Áurea!Antes dela, porém, maquiaram a Lei de terras, para que nenhum liberto pudesse comprar seu pedacinho de chão. Não havendo mais jeito mesmoos escravocratas, representados no legislativo, queriam indenização pela perda da mão-de-obra cativa. Osfazendeiros ricosinsistiam no direito à indenização e não ao dever de indenizar pelo trabalho expropriado das pessoas cativas e às custas destas haverem se enricado.

Recentemente, com o golpe parlamentar de 2016 e cerca aberta às “reformas”, boiada fora e fome certa os jabutis se proliferaram como coelhos pela casa. Prometeram o projeto político do Temer chamado de A ponte para o futuro, mas instalaram A pinguela do atraso, da democracia sem povo, de escritoressem livros, para leitores que não leem.

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Camilo Irineu Quartarollo, escrevente e escritor, autor de crônicas, historietas, artigos e livros

 

 

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