Roda de conversa – Da abstração à prática: conversa aborda os direitos humanos

Adelino Oliveira é professor de Filosofia no IFSP, campus de Piracicaba. Reprodução/Internet

 

A reeducação para as relações étnico-raciais com base num debate principiológico e conceitual sobre os direitos humanos foi a tônica da roda de conversa promovida na tarde desta segunda-feira (23) pela Escola do Legislativo da Câmara Municipal de Piracicaba.

Intitulada “Relações étnico-raciais e o programa dos direitos humanos”, a atividade contou com a facilitação do pós-doutor com pesquisa em Direitos Humanos, professor de Filosofia no Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba, Adelino Francisco de Oliveira, e foi mediada pelo jornalista, especialista em marketing e mestre em Administração, Marcelo Bongagna.

O evento, que foi transmitido ao vivo pelo Zoom e pela canal do YouTube da Escola do Legislativo, foi aberto pelo vereador Pedro Kawai (PSDB), coordenador da Escola do Legislativo, que agradeceu a participação de Bongagna e Adelino e frisou a importância de espaços de debate como este: “a Escola do Legislativo é um espaço de fomento à participação popular no dia a dia do nosso Legislativo”.

Programa de Direitos Humanos – “O ideal de justiça deve ser nosso tema fundamental. Mas como produzi-la em uma sociedade estruturalmente injusta?”, questiona Adelino ainda no início de sua exposição.

Para ele, o primeiro passo é entender que um programa voltado à construção dos direitos humanos não deve ser uma abstração, mas algo que “aponta para um outro modelo de sociedade, pautada pela justiça e pela dignidade humana”.

De acordo com Adelino Francisco de Oliveira, os direitos humanos vão para muito além dos aspectos mais facilmente visíveis, como o direito à alimentação e à saúde, mas englobam também o direito à cultura, à liberdade de crença e de ter um endereço fixo e um meio ambiente equilibrado. “O programa de direitos humanos vai se ampliando de acordo com a própria concepção de sociedade e de vida. Quanto mais a sociedade se expande na leitura do que é a vida, mais o programa de direitos humanos se expande”, diz.

Adelino reforça que os valores éticos humanos não são dados de antemão, não são naturais, mas sim construções coletivas, fruto de reflexões acumuladas ao longo de séculos. Ele destaca que, apesar de haver um ideário coletivo relativamente estável do que signifique a dignidade humana, pouco tem sido feito para que esses valores sejam realmente garantidos a todos: “vivemos em uma sociedade que constrói um discurso abstrato sobre os direitos humanos e a democracia, mas que, na prática, perpetua a opressão. (…) Se nós vivemos em uma sociedade em que 8 pessoas detêm a riqueza de 3,6 bilhões de pessoas, somadas, isso não é da natureza. É a escolha de um modelo de sociedade”, pondera.

É nesse contexto que professor Adelino propõe a reflexão sobre as relações étnico-raciais. De acordo com ele, o racismo é tributário de uma organização econômica pautada pela lógica colonial europeia que, ao longo de séculos, teve na exploração do trabalho escravo negro nas colônias a sua principal base de acumulação.

Dentro dessa lógica colonial, segundo Adelino, o pensamento dominante precisava se ancorar em teorias de superioridade racial, de cunho religioso, biológico ou psicológico para, assim, justificar a exploração: “eu tenho feito uma leitura econômica do racismo e da dimensão da escravidão: é muito conveniente para determinado grupo que você tenha outro grupo para trabalhar sem receber. É conveniente para o mundo branco e europeu que se imponha uma dinâmica imperialista, que os negros sejam reconhecidos como menores e não precisemos nem os pagar.”

Decolonialismo – Para Adelino Francisco de Oliveira – com base no pensamento de Frantz Fannon -, para se romper com a lógica colonial é preciso adotar um pensamento “decolonial”, ou seja, uma forma de pensar capaz desnudar e reverter a opressão de um segmento social por outro, colocando no centro do debate a implementação de políticas públicas que garantam a efetivação dos princípios previstos, por exemplo, no caso brasileiro, na própria Constituição Federal de 1988.

Por fim, de acordo com professor Adelino, um programa de direitos humanos não pode ser dissociado da democracia. No entanto, para ele, a democracia não pode ser tomada como um conceito abstrato, apenas como o ato de votar em um ou outro postulante a cargo eletivo mas, principalmente, deve ser encarada como a correta gestão dos recursos e ações públicas para que estas reverberem de forma positiva e afirmativa na vida cotidiana das pessoas.

“O programa dos direitos humanos, ele vislumbra essa utopia, de uma sociedade que não existe, mas que ela é possível. Ela é mais do que possível, ela é necessária. Ou nós vamos dizer que fracassamos enquanto projeto de sociedade e que milhões e milhões de pessoas nunca terão o direito de ser gente, ou nós vamos avançar para a utopia de que uma outra sociedade é possível”, conclui o professor.

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