Alento ao crédito

José Renato Nalini

 

Nesta safra de más notícias, vi com satisfação a intenção de alavancar o crédito imobiliário, com a simultaneidade de alienações fiduciárias sobre um único imóvel, até exaurimento de seu valor de garantia.
Essa providência já tardava. O Brasil desperdiça um valioso patrimônio quando não permite que haja várias alienações ou várias hipotecas incidentes sobre um único imóvel. Não é apenas para facilitar a vida negocial dos abonados, mas o alcance social da medida é evidente. Um proprietário de pequena residência pode obter crédito para aquela viagem sonhada, para os estudos de um neto, para a ampliação da casa que nunca dantes conseguiu.
Se o Brasil fosse uma República em que as boas ideias não fossem interrompidas a cada gestão, como se fora necessário reinventar a roda a cada quatriênio, tanta coisa já teria sido feita para ajustar nossa cambaleante economia ao ritmo imposto por uma sociedade digital e globalizada.
Uma dessas iniciativas já fora anunciada em 2014, como fórmula simplificadora dos procedimentos de aquisição de imóveis, setor em que o Brasil fora praticamente reprovado pelo Doing Businesse (Fazendo Negócios) do Banco Mundial. Detectou-se um número absurdo de exigências – superior a catorze – para que alguém se torne proprietário de bem imóvel nesta República.
A proposta era a concentração, na matrícula do imóvel, de todas as informações de atos jurídicos que pudessem resultar em ônus sobre a propriedade. Ela chegou a ser chamada de “Renavam dos imóveis” e suas vantagens eram manifestas: eliminação da necessidade de consulta a diversos cartórios, proteção integral do comprador do imóvel, aumento da segurança jurídica nas operações, redução de custos operacionais para a aquisição e financiamento, facilitação das fórmulas de captação de recursos no mercado financeiro para o financiamento imobiliário, a chamada venda de carteira.
Segundo se acenava, antes da providência, que viria por Medida Provisória, a aquisição imobiliária dependia de consulta a vários cartórios, presente o risco jurídico durante e depois da aquisição, custos operacionais elevados e prazos excessivos nessa burocracia. Depois, haveria a concentração das informações sobre o imóvel, com baixo risco jurídico, durante e depois da aquisição, redução de custos e processo de aquisição e financiamento mais acelerado.
Propunha-se nova fonte de financiamento para o mercado imobiliário, com a criação de Letras Imobiliárias Garantidas, as “Covered Bond” do direito americano. Esse novo título tem dupla garantia: cobertura da Instituição financeira emissora e a carteira imobiliária apartada dos ativos em caso de liquidação da emitente. Segurança jurídica assegurada no financiamento a longo prazo, com redução dos custos, atração de investidores, inclusive os estrangeiros, pois é esse o padrão internacional e isenção de IR para pessoas físicas, desde que o prazo médio fosse superior a dois anos.
Outra boa novidade, a “home equity”, um incentivo ao crédito garantido pelo próprio imóvel. Isso permite o alongamento e a melhoria do endividamento das famílias. Parte dos recursos da caderneta de poupança aplicados no mercado imobiliário usado para operações de crédito com imóveis quitados oferecidos como garantia. O limite seria de 3% dos recursos captados pela poupança. Sistema que reduz custos operacionais, com crédito utilizado para qualquer finalidade, o que geraria cerca de dezesseis bilhões em novas operações.
Propôs-se ainda o aprimoramento da segurança jurídica do crédito consignado privado, com redução de risco de inadimplência e facilitação do acesso dos trabalhadores a crédito mais barato. O tomador do crédito poderia autorizar a instituição financeira a debitar o valor da prestação simultaneamente ao crédito do salário em conta corrente. Mantido o limite de comprometimento a 30% da renda, seria algo muito bem vindo.
Também se falou em fortalecimento da alienação fiduciária, para aumentar a oferta de crédito e facilitar a recuperação de bens financiados por essa modalidade. O adquirente autorizaria em contrato de financiamento a recuperação do bem financiado em caso de inadimplência, com dispensa do protesto, mas comprovação da inadimplência por meio de carta registrada. Também se acenou com a dispensa de obrigação de cobrança judicial para fins de dedução de tributos por parte das instituições financeiros, em casos de operação sem garantia de até cem mil reais e operações com garantia de até cinquenta mil reais.
Tudo isso foi anunciado pelo então Ministério da Fazenda, como melhoria do marco regulatório para o crédito. O que está funcionando? Há falhas? Quais as propostas de aperfeiçoamento do sistema? O Brasil precisa fortalecer o crédito, para poder sonhar com o resgate de uma economia que já foi uma das maiores do planeta.
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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL); foi presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

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