1º de abril

Camilo Irineu Quartarollo

 

Para Leonel Brizola o golpe de 1964 não foi em 31 de março, mas no primeiro de abril. Contudo, os generais temendo o dia da mentira preferiram ficar por 21 anos a partir do último dia de março e com o escorregão da operação Popeye.
Com a renúncia do presidente Jânio, em 1961, e o vice Goulart fora do país em viagem à China, os militares já anteviam a chance de tomar o poder três anos antes de 64, mas impedidos por Brizola naquela época, com a Campanha pela Legalidade e posse do vice. No Golpe de 64, a propaganda difamatória e possibilidade de invasão armada americana com seus marines foram decisivas para derrubada de João Goulart, que desta vez preferiu recuar a ver o Brasil num banho de sangue.
Na madrugada de 31 de março de 1964 o general Mourão Filho precipitou sobre a capital do país com seu exército, na operação Popeye, mas salvou o golpe militar do dia da mentira. Em 1937 o general já tragava nas fileiras de golpes com o plano Cohen, no governo Vargas. Cachimbava, mas para não se isolar em Minas teria de comer muito espinafre! Restou ao filho da ditadura uma operação marinheira, sair antes que chegasse o “Brutus” e apareceu com os generais vitoriosos.
É cediço que no país do futebol, na falta de bom assunto tudo acaba em piadas de bar, como se fosse sempre com os outros. O que dá para rir dá para chorar se é com a gente.
A ditadura fez muitos males, matou muita gente, executou à queima roupa e por sessões terríveis de tortura a gentes de oposição, opiniões próprias, partidárias ou não. Muitos mortos como Vladimir Harzog e outros, sobreviventes desse Auschwitz brasileiro, como a ex-presidenta Dilma Roussef. Os Direitos Humanos, ora, eles detestam esse tema! Os torturadores eram muitas vezes religiosos, beijavam o crucifixo, seus filhos, esposa e saíam para operar a “cadeira do dragão” sob gritos e ais na calada da noite. As mães temiam pelos filhos vivos ou sumidos.
No regime militar, aliás regime e carestia, a tortura podia ser suspensa ou evitada se tivessem algum amigo no alto escalão do governo. Muitas brutalidades às vistas grossas, pois, no Brasil, desde a escravidão mais cruel é comum a conivência cega, surda e cochichada de pretextos prontos juntos aos deuses-me-livre de orelha do “aí, se foi torturado é porque alguma coisa feiz, né”. Contudo, as pessoas, que já não tinham mais o que perder se unem e se rebelam num movimento contra a barbárie instituída nos porões da ditadura, muitos caíram mortos nessa guerra oculta de corpos sumidos sob o discurso de “nação pacífica” da rede nacional. Ainda tem gente procurando comunistas embaixo da cama e saudosos do enganoso primeiro de abril. Pior, quem toma a casa, a liberdade de ir e vir, o progresso, o petróleo, os direitos e a autoestima não são os comunistas, mas bancos, pedágios, operadoras que não prestam contas aos usuários e a retirada dos direitos trabalhistas e previdenciários.

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Camilo Irineu Quartarollo, escrevente, escritor, autor de crônicas, historietas, artigos e livros

 

 

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