No centenário do falecimento da Princesa Isabel

Armando Alexandre dos Santos

 

Concluímos hoje a série de artigos sobre a Princesa Isabel, cujo centenário de falecimento ocorreu em novembro do corrente ano.

Em 1914, rebentou a Primeira Guerra Mundial, que afetaria profundamente a vida da Princesa. Dois de seus filhos – D. Luiz e D. Antonio – desde logo se engajaram como voluntários no exército britânico. Ambos morreriam em consequência da Guerra. D. Luiz, que pela renúncia do irmão mais velho se tornara Príncipe Imperial e herdeiro dinástico imediato da Princesa, lutou durante alguns meses, mas contraiu no inverno gelado de 1914-1915 um gravíssimo reumatismo ósseo, que o tornou semiparalítico. Depois de 5 anos de sofrimentos, faleceu em 1920, com apenas 42 anos de idade. Foi condecorado post mortem por seu valor e se tornou conhecido como “o Príncipe Perfeito”.

O filho mais novo da Princesa, D. Antônio, lutou com grande heroísmo durante toda a Guerra. Poucos dias depois de concluída esta, ainda mobilizado, sofreu acidente em seu avião militar, que caiu no sul da Inglaterra. Morreu dois dias depois, em decorrência dos ferimentos recebidos.

Essas duas mortes abalaram muito a saúde da Princesa. Em 1920, o Presidente Epitácio Pessoa revogou o decreto de banimento da Família Imperial, que havia sido decretado pelo Governo Provisório de Deodoro da Fonseca. As condições de saúde da Princesa não lhe permitiram realizar o desejo que acalentara durante três décadas: não pôde em vida retornar ao Brasil. Faleceu no Castelo d´Eu, no dia 14 de novembro de 1921, aos 75 anos de idade. Uma carta do Conde d´Eu, dirigida a D. Amanda Paranaguá Dória, Baronesa de Loreto, amiga de infância da Princesa, relata seu fim de vida:

 

“Castelo d´Eu, 19 de novembro de 1921 (Dia de Santa Isabel de Hungria, que era o dia dela!)

Senhora Dona Amanda,

Estas são as primeiras linhas que escrevo para o Brasil depois do terrível golpe; e nem estou em estado de dar-lhe, como desejaria, pormenores. Não quero, porém, deixar de enviar-lhe já as inclusas fotografias que ela lhe destinava (…), assinando-as na manhã do mesmo dia em que se declarou a febre que o médico logo atribuiu a embaraço pulmonar, e nem mesmo talvez três horas antes! O mal, embora com altos e baixos, não cessou mais durante os dias seguintes (nos quais se confessou longamente e recebeu a Sagrada Comunhão) até que no 5º dia, dia 14, pelas 9h1/2 da manhã perdeu repentinamente os sentidos e não durou nem meia hora, chegando, contudo, o Pároco a tempo de aplicar a Extrema-Unção, todos nós de joelhos em roda, à exceção das crianças, que só mais tarde foram chamadas para dar o beijo de despedida à querida Vovó!

Calcule a desolação em que ficamos e amerceie-se da desgraça deste amigo velho de todos os seus. a) Gastão d´Orleans”

 

A notícia da morte da Princesa repercutiu em todo o Brasil, que jamais a esquecera e até a transformara em personagem legendária. A Redentora que sacrificara seu trono para libertar os escravos e que até morrer sempre dizia”mil tronos tivesse eu, mil tronos sacrificaria de bom grado para que não mais houvesse escravos no Brasil” estava, agora, na posse de um trono no Paraíso. Uma velha canção infantil que ainda hoje se canta em certas regiões do Brasil exprimiu esse sentimento popular: “Princesa Dona Isabel, / Mamãe disse que a Senhora / Perdeu seu trono na terra, / Mas tem um mais lindo agora. / No céu está esse trono / Que agora a Senhora tem, / Que além de ser mais bonito / Ninguém lho tira, ninguém”.

 

Somente em 1953 os corpos da Princesa Isabel e do Conde d’Eu foram transladados para o Brasil; desde 1971 repousam na Catedral de Petrópolis, onde também se conservam os restos mortais do Imperador D. Pedro II e da Imperatriz D. Teresa Cristina. Especialmente no dia 13 de maio de cada ano, é muito grande o afluxo de visitantes que comparecem ao local, para venerar sua memória. No momento, estão sendo dados, no âmbito da Arquidiocese do Rio de Janeiro, os passos preliminares para a futura abertura do processo de beatificação da Princesa Isabel (1846-1921), Princesa Imperial e herdeira do trono do Brasil.

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Armando Alexandre dos Santos, licenciado em História e em Filosofia, doutor na área de Filosofia e Letras, membro da Academia Portuguesa da História e dos Institutos Históricos e Geográficos do Brasil, de São Paulo e de Piracicaba.

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