Cotas, sim

José Maria Teixeira

 

Há uma necessidade de discutir, ou melhor, avaliar  a lei de quotas estabelecida para negros , pardos e indígenas e saber com maior profundidade a sua importância  para a nação brasileira a partir de resultados já obtidos, pois, aproxima-se o prazo de sua vigência previsto para 08/2022. A lei de cotas sob numero 12.711/2012, criada pela presidenta Dilma Rousseff (PT), sendo ministro da Educação Aloisio Mercadante (PT).

As cotas visam a acabar com a desigualdade racial e o racismo estrutural resultantes de anos de escravidão no Brasil, que ainda excluem pessoas negras, pardas e indígenas da universidade, do mercado de trabalho e dos espaços públicos. A desigualdade racial é caracterizada pelas diferenças sociais entre brancos e negros. No Brasil, de acordo com o IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, por exemplo, os negros representam 75,2% do grupo formado pelos 10% mais pobres.

Quando, então, cidadãos negros e negras sem condição econômica financeira acessam instituições  de ensino superior e alcançam   seus objetivos mediante cota racial; quando empresas (Lojas Marisa e outras ) se iniciam em política de cotas abrindo espaço para trabalhadores negros e negras com programas em todos os níveis do setor empresarial, assim como vem ocorrendo em outros setores da vida civil  e publica. Tudo isso permite não sonhar, mas viver a esperança concreta de um Brasil no estado democrático de direito. Acredita-se nisso, apesar do presidente atual  ser completamente destituído de racionalidade e destruidor das medidas protetivas. Dele, pode-se dizer, guardadas as devidas proporções, foi eleito pelo voto negro.  Apesar dele, amanhã,  tudo será diferente.

A alma dessa transformação é a política de cotas para  negros, pardos e indígenas . É esta política que se constitui efetivamente no instrumento fundamental capaz de quebrar o formalismo e dar concretude ao artigo 5º da nossa Lei Maior: “todos são iguais perante a Lei”. Mesmo porque  todos sabem que, para ser igual, não basta o querer ou se declarar ser igual. É preciso poder ser igual. É este poder que as cotas e ações afirmativas lhes oferecem para negros, negras, pardos e índios para poderem ser iguais. É o caso do ajudante de pedreiro e camelô, nascido na Bahia, que sempre quis ser diplomata.

Porem, ante as dificuldades de acesso àquela instituição, Instituto Rio Branco, acrescida da sua negritude marcado, pois, com o racismo estrutural, não teve duvidas: desistiu.

Contudo, e em tempo, surge o Enem com cotas para negros e negras, oriundos da escola pública. O postulante retomou seu sonho e hoje é diplomata, membro da instituição de difícil acesso para brancos e proibitiva para negros e negras não fora o Enem, política de cotas. Querem saber de quem se trata? Procurem no Itamaraty  por Jakson Lima e ouçam a historia dele por ele mesmo.

Portanto, sem nenhuma dúvida, ações afirmativas, cotas, sim.

Para felicidade do povo negro e por que não do Brasil?  Há um numero expressivo de negros e negras em todos os setores do saber universitário, comprovando eficientemente e com rapidez o objetivo proposto: “… inclusão dos negros e negras na sociedade  brasileira, via universidade”.

A primeira proposta de implantação de um sistema de quotas raciais no Brasil foi apresentada em 17 de novembro de 1999, durante a Semana da Consciência Negra, na Biblioteca Central da Universidade de Brasília por Rita Segato e José Jorge de Carvalho, que viria a ser aprovada em 2003 e finalmente implantada em 2004.

Em pouco tempo, em dados estatísticos, após sete anos de promulgação da Lei Federal de Cotas  e de 15 anos do início da política de cotas no Brasil – o vestibular da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) foi a pioneira no país -, temos, pela primeira vez, um percentual de 50,3 dos estudantes do ensino superior que se declaram pretos ou pardos. Isso revela o sucesso das cotas no Brasil – pelo menos em parte.

Os dados da pesquisa Desigualdades Sociais por Cor ou Raça Brasil foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). O estudo revela que para alcançar um patamar como esse é necessário um conjunto de políticas públicas, como a das políticas afirmativas. Por isso, elas são importantes, dando conta de apontar medidas que beneficiam especialmente a parcela da população que não consegue acessar bens e serviços por conta da exclusão social. Não se pode esquecer que a luta se trava contra o racismo estrutural fruto dos cento e tantos anos de escravidão negra neste Brasil feito também e particularmente pelos negros e negras. Para assim entender tomem na historia os ciclos econômicos, e digam o que seria o Brasil hoje sem aqueles ancestrais? ainda hoje, sob o manto da falsa democracia racial traçada por Gilberto Freire, sociólogo, mulheres e homens negros, no mundo do trabalho em condições iguais ganham menos que os homens e mulheres brancas. Em que pese a extensão das demandas para o enfrentamento das desigualdades e o bem estar social, no que tange o povo negro, o Brasil tem a segunda maior população negra do mundo, mesmo assim a pesquisa do IBGE mostra o sucesso das cotas. Portanto, honestamente assegurando a dignidade humana:  cotas sim.

É o que diz José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares em relação ao prazo de vigência da Lei de cotas, agosto de 2022: “Não existe outra medida com tamanho grau de justiça, assertividade e impacto social. É inimaginável pensar outro caminho e solução que não a prorrogação da lei por mais 10, 20, 50 anos ou a eternidade de anos que for necessária ate que as desigualdades da exclusão e dos inacessos sejam dirimidas”.

Não há duvida.  Lidar com as especificidades desta natureza demanda uma política de perspectiva universal dificilmente limitada pelo tempo mesmo porque inseridas na própria dinâmica da natureza humana. Isto indica definitivamente uma revisão para melhora da lei de cotas e sua continuidade, jamais o seu fim. Cotas, sim.

Se as pessoas têm diferentes condições de acesso, jamais poderão ocupar os mesmos lugares apenas por um esforço pessoal. A população mais pobre, excluída e vulnerável, deve ser priorizada numa busca por maior equilíbrio e justiça social.

Cotas, sim. Entendendo  que se trata de um passo inicial. Isso porque a presença nas universidades públicas não é suficiente para garantir a permanência e conclusão do curso, muito menos de que será garantido o exercício da profissão em iguais condições que a outra parcela de pessoas brancas formadas. Portanto, cotas, sim.

Para mudança do atual quadro sócio-politico econômico brasileiro em que se vive, ainda,  o lema: onde tudo é menos o negro é mais; onde tudo é mais o negro é menos  é fruto do conceito de brasilidade criado pelo sistema e consagrado na obra obra de Gilberto Freire, sociólogo. Conceito que não passa de uma construção oficial sofistica que permitiu acolher pela celebração da mestiçagem uma suposta cordialidade de  convívio interracial acoplada ao silencio das desvantagens impostas aos negros, negras, pardos e indígenas. Esse discurso pregado aos quatro ventos, imprensa escrita e falada, além da aprendizagem nas escolas públicas e particulares, encobriu a pratica sistemática da descriminilização racial. Neste contexto, vale o ditado: “o peixe morre pela boca, o homem pela cabeça”. Portanto, cotas, sim.

Pelas cotas na universidade. De lá, pela ciência e reflexão no mundo da vida. Por agora precisa-se de cotas como de vacinas para sobreviver. A lei de cotas deva ser avaliada e sua vigência continuada. Pois de cujos resultados já comprovados um maior respeito para com a pessoa dos negros, negras, pardos e indigenas impederia as autoridades constituídas  de as custas do trabalho deles criarem um novo touro de ouro a ser filetado e saboreado por poucos na mesa do congresso sob a denominação de orçamento secreto.

Urgente,  cotas, sim.

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Jose Maria Teixeira, professor

 

 

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