Lágrima de culpa não seca

Pedro Kawai

 

Não há qualquer explicação que possa justificar a agressão do deputado estadual Frederico d´Ávila (PSL) contra Sua Santidade, o Papa Francisco, chamado por dele de “vagabundo”, “safado” e “pedófilo”, em seu discurso na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, na noite do último dia 14 de outubro, ao se referir à citação feita pelo arcebispo de Aparecida, Dom Orlando Brandes, o qual afirmou que “pátria amada não pode ser uma pátria armada”.

Contraditoriamente, o deputado alegou que suas palavras foram ditas sob forte pressão emocional, pois, segundo ele, teria sido vítima, na frente da esposa e dois filhos menores, de uma tentativa de homicídio no dia anterior. Quase foi vítima da Pátria Armada que ele parece defender.

Mais que um xingamento, as palavras proferidas por um deputado estadual, da importância que tem o Estado de São Paulo, pode ser capaz de provocar problemas diplomáticos, já que o Papa Francisco também é um Chefe de Estado, além de bispo de Roma.

Em seu discurso repleto de ódio, preconceito e extremismo, o deputado Frederico D´Ávila não desrespeita apenas o líder da Igreja Católica, o arcebispo de Aparecida ou a CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil), mas sim, a maioria da população brasileira que é católica, e, assim como eu, também se sentiu agredida pelas referências injustas e caluniosas feitas por ele.

“Vagabundo”, no sentido literal da palavra, é alguém que vaga, que não tem destino, que está perdido, o que certamente não é o caso do Papa Francisco ou de Dom Orlando. A acusação de pedofilia é ainda mais grave, e merece ser repudiada formalmente pelos deputados estaduais, assim como requer punição exemplar, porque acusar sem provas é crime e, neste caso específico, sem direito à defesa, covardia.

D´Ávila revelou, por trás de toda a sua amargura, o ódio contra os movimentos sociais, classificando a CNBB de câncer e dizendo que ela deve ser “extirpada da sociedade”, porque permite movimentos sócioeclesaiais como a Teologia da Libertação, a qual se caracteriza pela crítica à realidade social e ampara os oprimidos em favor de seus direitos.

Alertado sobre a gravidade de suas afirmações, o deputado recuou e se desculpou pelas ofensas, como se fosse possível apaga-las das nossas mentes e corações. Isso me faz lembrar de um antigo provérbio que diz haver três coisas na vida que não “voltam atrás”: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida. E ele errou em não ter segurado a flecha contra os católicos, ao não se conter defendendo o indefensável e a ter perdido a oportunidade de permanecer calado, ao invés de dizer tantas palavras odiosas, indignas de um parlamentar que faz um juramento de defender a lei e a sociedade.

Já passou do momento de a sociedade aceitar xingamentos, ofensas, acusações e bravatas de políticos que, mesmo eleitos democraticamente, utilizam seus mandatos como instrumento de vingança e de opressão. Isso não é liberdade de expressão e muito menos pode ser classificado como legitimidade decorrente da imunidade parlamentar. Chega! A sociedade não merece e não pode ser representada por pessoas que pregam a discórdia, a divisão, o fanatismo e a violência.

Além da educação que recebemos em casa, temos regras sociais, leis que asseguram a ordem e o respeito entre as pessoas e os poderes constituídos. Não podemos mais conviver com a impunidade alicerçada pelo medo das urnas, ou pelo revanchismo de quem delas se favoreceu.

Sinceramente, espero que a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo cumpra com o seu dever de punir exemplarmente este senhor que não parece honrar a função pública para a qual foi eleito. Do mesmo modo, entendo que a sociedade também deva se pronunciar, assim como a CNBB o fez, em defesa de Sua Santidade e do arcebispo, reconhecidos pela defesa da paz, da fraternidade e da igualdade social.

De nada adianta depois chorar no banheiro. Como bem disse Pe. Mauro José Ramos, “Lágrima de culpa não seca… Lágrima de culpa, mancha! ”.

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Pedro Kawai (PSDB), vereador em Piracicaba, membro do Parlamento Regional

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