Descaminho

José Maria Teixeira

 

Esta é uma narrativa que melhor seria não tivesse acontecido. Pois, ela gerou dúvidas, maus pensamentos até revolta. Será que sobre este fato poder-se-ia dizer que ninguém tem nada a ver? Mas afinal que fato foi esse que causou desconforto presencialmente a milhares  e a milhões alcançados pela mídia televisiva? Pois bem, trata-se do dia doze de outubro recente. Neste dia, celebram-se dois fatos de relevância para a sociedade brasileira. Primeiro é o dia de Nossa Senhora Aparecida consagrada como padroeira do Brasil. Em que pese o país ser um estado laico, a decretação do feriado nacional para o culto à “mãe do Brasil”, não teve, não tem e acredita-se jamais terá óbice ao sistema constitucional tendo como base a influencia ocidental cristã e mesmo porque esta devoção já encampa espontaneamente de há muito a alma do povo brasileiro.

De outra feita, é também o dia da criança que, independente da afetividade natural das fases do mundo infantil até mesmo da pré-adolescência, está a exigir uma dose maior de ternura e cuidados nesta fase de quase pós pandemia da Covid-19. É quando, no santuário, surge a figura do então presidente da Republica, Jair Messias Bolsonaro. O que pensar?

Não se pode esquecer ser esta manifestação um direito-dever de todo cidadão que aceita e se coloca sob o manto protetor da mãe de Deus e tem na criança a razão de uma Nação. Embora seja possível cumpri-la em qualquer canto desta terra Brasil, não deixa de ser mais prazeroso fazê-lo no âmbito do turismo religioso Aparecida do Norte. Neste dia milhares e milhares de fieis de todo pais por ali transitam e se concentram. É fantástico. De cada duas horas guardando a norma sanitária do distanciamento em razão do coronavirus, acolhe-se na Basílica duas mil e quinhentas pessoas. Ali, rezam, agradecem as graças alcançadas, acedem velas, deixam alguns pertences símbolos das promessas ora cumpridas. E como se despedindo voltando para a casa cantam “Salve rainha, mãe de misericórdia, esperança nossa…”.

Afinal, e o Bolsonaro? Será que ele também ali foi prestar homenagem à “Mãe Aparecida”  e  celebrar o dia da criança?

Como homem público, presidente do Brasil, todos têm a ver sim com os seus passos. Apesar de se dizer cristão, deixa dúvidas sobre sua presença nesse dia na basílica de Aparecida. As portas de igreja não se fecham para ninguém. Que ele possa lá estar nesse dia, que possa assistir a missa, fazer o ato penitencial e ate receber a eucaristia, não cabe a ninguém julgar. Pois, estas são coisas do foro intimo. E como diz o principio cristão: “De internis nec eclésia”, isto é, das coisas internas nem a igreja se pronuncia.

Porém, não se segue daí, por ser quem ele é, possa ocupar o altar, proceder a liturgia da palavra livro de Ester, 7,3 e consagrar o povo brasileiro à Nossa Senhora Aparecida. Aqui há de se perguntar: quem está zelando pela casa de Deus em Aparecida? Parece que nem mesmo os padres redentoristas. Ou há algum protocolo litúrgico obrigando seja o presidente da Republica a consagrar o povo brasileiro à Padroeira do Brasil, como ocorreu, independente de seu caráter de sua postura pública?!

Já se sabe quem é Jair Messias Bolsonaro. Leiam a carta vazada na rede publica, 26/07/ 20, assinada por bispos e arcebispos contra Jair Messias Bolsonaro, presidente do Brasil, pelas suas atitudes e ações altamente prejudicais à vida do povo. Sem sombra de duvida pode se afirmar que o objetivo de Bolsonaro, em Aparecida, nesse dia fazendo o que fez dentro da Basílica, era ser visto ali e por milhões pela mídia televisiva. Não se pode esquecer da necessidade premente de aumentar a sua popularidade baixíssima entrando em processo político eleitoral. É para isso que veio a Aparecida nesta data. Presente no altar da Basílica fazendo leitura durante a liturgia da palavra. Tudo televisionado, era o seu objetivo aparecer a grande publico em condição excepcional e de alta aceitabilidade pelo povão. Descaminho que antes já ocorreu. Espera-se que não mais aconteça.

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José Maria Teixeira, professor

 

 

 

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