Edson Rontani Júnior
A comunicação não funcionava de forma instantânea como hoje. Na verdade, ela viajava na bagagem de navios e no lombo de cavalos. As missivas demoravam meses para chegar às mãos de seus destinatários. Dias atrás, li que o nascimento de d. Pedro II só chegou a Piracicaba um mês após o fato propriamente dito. Me lembro que a França só recebeu a notícia e reconheceu a independência do Brasil em 1824, dois anos depois do grito no riacho do Ipiranga.
O mesmo ocorreu com o fim da Revolução Constitucionalista cujo armistício foi assinado em 2 de outubro de 1932. Os jornais de Piracicaba ainda noticiavam o conflito entre paulistas e as forças federais quando as armas já haviam sido depostas. Uma nota em “O Momento”, de 6 de outubro daquele ano relata, de forma indelével, a rendição dos paulistas, quando se programava, para aquela data, uma romaria entre os voluntários que já se encontravam na cidade.
Piracicaba contava com três jornais matutinos: “O Momento”, “Gazeta de Piracicaba” e “Jornal de Piracicaba”. As informações impressas se complementavam com o burburinho das praças e nos alto-falantes como aquele instalado em frente à redação de “O Momento”, na rua São José, próximo ao atual Poupatempo Estadual. Um diário era lido de segunda a segunda pontualmente às 13 horas, alguns minutos após uma sirene soar, convocando a população a se aproximar e tomar conhecimento dos fatos da noite anterior. Notícias estas conseguidas por rádio, telegramas ou voluntários que estiveram no front de batalha e se aqui se encontravam em visita.
Curioso é ver que a cidade se calou após a rendição das forças revolucionárias. Os jornais que, de julho a setembro, traziam manchetes sobre o recuo das tropas federais e a vigilância nas divisas de São Paulo, começaram a mudar o tom, trazendo artigos como as “pequenas doses do galicismo”, tema de capa por diversas vezes da “Gazeta de Piracicaba”, ensinando a influência da língua francesa (dominante na época – o inglês se tornou usual apenas após a Segunda Guerra Mundial).
Piracicaba voltava ao normal. Escolas retomavam as aulas, o comércio voltava à sua rotina. O silêncio era premeditado, pois, Getúlio Vargas deportou os líderes da Revolução Constitucionalista para Portugal e muitos acabaram temerosos com possíveis perseguições.
A partir da segunda quinzena de outubro de 1932, a imprensa local passa a explicar o propósito do Batalhão Piracicabano, alcunhado de “A Columna Maldita” por seus membros agirem como mercenários, segundo relatos das forças federais. Houve embate público entre dois veículos de comunicação sobre o saldo moral e físico dos soldados e o soldo neles investido.
Resultado: 20 piracicabanos mortos em combate ou em decorrência dos quase três meses da luta armada. Alguns não retornaram à Piracicaba, sendo enterrados em campos de batalha como nas cidades de Areias e Itapira, que foi o caso de Romário Nery e Jorge Jones.
Meses depois … anos depois … A história perpetuou a memória dos 600 “Voluntários de Piracicaba” que deixaram lar, família e a cidade para empunhar armas contra o que era considerada a “Dictadura Vargas”. Essa memória ainda hoje faz parte de nossa rotina, com o Mausoléu do Soldado Constitucionalista erigido no Cemitério da Saudade, do Monumento ao Soldado Constitucionalista retirado em 1981 e remontado em 1988 na praça José Bonifácio, a denominação de praça (Ennes Silveira Mello em frente ao TCI – Terminal Central de Integração), e ruas com a denominação MMDC ou com nomes de piracicabanos que deram a vida pelo democracia. São 89 anos de fatos encerrados no último sábado e que não ficarão esquecidos em 2022 quando serão lembradas as nove décadas de evento que é orgulho para muitas cidades, inclusive para Piracicaba.
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Edson Rontani Júnior, jornalista