A romanização do cristianismo e o movimento espírita

Alvaro Vargas

 

As primeiras perseguições contra os cristãos foram promovidas pelo sinédrio judaico, que não reconheceu Jesus como o Messias. Contudo, os cristãos gozaram de relativa tolerância religiosa no império romano até o grande incêndio em Roma, episódio em que foram injustamente responsabilizados pelo imperador Nero. Como consequência, foram presos, torturados e martirizados das formas mais bárbaras possíveis. Outros imperadores que se seguiram, perpetuaram essas perseguições, que só terminaram quando o imperador Constantino, “simpático” ao Cristianismo, através do Édito de Milão (313 d.C.), permitiu a liberdade religiosa. Posteriormente, ele conclamou o Concílio de Niceia (325 d.C.), buscando unificar essa religião, mas essa expansão se tornou mais proeminente após a decisão do imperador Teodósio declará-la religião oficial do Estado (381 d.C.). Nesse processo, foi criada a Igreja Católica Romana, que atendendo aos interesses políticos, absorveu o paganismo romano, afastando-se do Cristianismo primitivo. A igreja que antes atendia aos pobres, passou a ser frequentada pelo imperador e nobres romanos, ocorrendo uma mudança de local dos cultos, saindo das catacumbas para templos e basílicas. Nos rituais, surgiram o uso de incenso, símbolos, liturgia, vestimentas, e a substituição do panteão dos deuses pela adoração aos “santos”.

Conforme o espírito Emmanuel (A Caminho da Luz, cap. 16, Chico Xavier), o Cristianismo passou então a ser divulgado sem a mesma humildade de outros tempos. As autoridades eclesiásticas ao procurarem um acordo com o paganismo, modificaram as tradições puramente cristãs, adaptando os textos evangélicos segundo os seus interesses, improvisando novidades injustificáveis. Na busca da consolidação dos poderes da igreja, compreenderam ser preciso fanatizar o povo, impondo-lhe as suas ideias, as suas concepções, e, longe de educarem as almas das massas, na sublime lição do Nazareno, entram em acordo com a sua preferência pelas solenidades exteriores, pelo culto fácil do mundo externo, tão ao gosto dos antigos romanos pouco inclinados às indagações transcendentes. Como resultado, “a civilização está em crise, e pode ser apontado como uma das causas desse estado caótico a defecção espiritual da Igreja Católica, negando-se a cumprir as determinações divinas para disputar um lugar de dominação, nos banquetes dos poderes temporais do mundo. Se houvesse mantido a sua posição espiritual, fortificando as almas no seu longo caminho evolutivo, como mediadora entre o Céu e a Terra, as transições sociais, inevitáveis, não seriam tão penosas” (Emmanuel, cap. XXI, Emmanuel e Chico Xavier).

De acordo com Yvonne A. Pereira (Pelos Caminhos da Mediunidade Serena, Quinta Entrevista, Pedro Camilo), o fenômeno da deturpação das coisas santas tem se sucedido no seio de todas as filosofias religiosas. Assim como aconteceu com o Cristianismo a partir do III século da era cristã, está acontecendo com o Espiritismo, devido ao despreparo de seus dirigentes, que não possuem o conhecimento doutrinário adequado, para a sua prática e a sua divulgação. O alerta dessa saudosa servidora do Cristo corrobora com as informações prestadas por Allan Kardec (Obras Póstumas), de que um dos maiores obstáculos capazes de retardar a propagação dessa doutrina seria a falta de unidade. Ele reafirmou a importância de vivenciá-la em todas as instâncias da vida, indicando o caminho da fraternidade para superar os entraves e construir a união e a unificação espírita.

Para isso, os centros imbuídos do verdadeiro espírito do Espiritismo deverão estender as mãos uns aos outros, fraternalmente, e unir-se para combater os inimigos comuns: a incredulidade e o fanatismo. Temos plenas condições de manter a pureza do Espiritismo, o Consolador prometido por Jesus (João, 14:26), conforme ele nos entregou (Espírito da Verdade). Mas para isso, é fundamental nos libertarmos do personalismo e da ambição pela conquista de valores transitórios e vivenciarmos os seus ensinamentos.

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Alvaro Vargas, engenheiro agrônomo, Ph.D., presidente da USE-Piracicaba, palestrante e radialista espírita

 

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