Constrangimento à Polícia Federal

Felipe de Menezes

Teresa Cristina Dip Rossi

 

“Édipo, o tirano” é uma clássica personagem da mitologia grega. Ficou conhecido por seu orgulho excessivo e por ter ultrapassado a medida humana querendo se igualar aos deuses. Após cometer, sem saber, o crime de matar o seu pai (rei de Tebas) e de ter se casado com a sua própria mãe, e com ela ter tido quatro filhos (também sem saber), a cidade de Tebas cai em uma pandemia sem fim. Os deuses querem vingança a quem matou o rei. Começa a luta, então, para se descobrir quem cometeu tal crime. O assassino que Édipo procura é ele próprio. O que o mais importa nessa história é o seguinte: toda a cidade começa a entender o que aconteceu, menos Édipo. Os mais antigos da cidade o aconselham, seus entes familiares o aconselham, o mais sábio da cidade o aconselha, mas Édipo é irredutível, um tirano que está cego e fechado em si mesmo. Não ouve ninguém, não acredita em ninguém. Sua vaidade e seu orgulho desmedido o conduz a um final trágico.

Mais uma vez artistas da cidade e a população se unem contra uma decisão equivocada vinda do 11º andar do Centro Cívico (ou seria de uma pequena sala na Rua Alferes?). A essa altura todes já devem saber que o governante local (ouvindo apenas a sua “base”) resolveu lutar contra a própria cidade no que há de maior nela: seus símbolos culturais. Ao querer transferir a Pinacoteca do lugar onde foi projetada arquitetonicamente para estar e abrigar uma sede policial, o prefeito comete um “crime” simbólico contra a própria cidade por ele administrada. Aliás, o pior crime que um governante pode cometer é contra os símbolos que formam a sua (própria) comunidade. Aprende-se a amar o XV de Piracicaba ouvindo desde pequeno o seu hino, colocando a sua camisa, indo ao estádio, acompanhando e torcendo por suas vitórias. Para se construir uma comunidade é preciso conhecer e re-conhecer reiteradamente os seus símbolos. O que nos torna pessoas piracicabanas certamente não é termos uma Polícia Federal na cidade, mas é termos uma casa de artes que foi construída para abrigar a arte que se produz das mãos dos filhos de sua terra. Quando o prefeito (ouvindo as vozes “amigas”) insiste em uma atitude de certa forma ensurdecida, mesmo tendo toda a cidade dizendo não, mesmo tendo os mais jovens dizendo não, mesmo tendo os mais antigos dizendo não, mesmo tendo os mais sábios dizendo não… ele passa a “medida humana” porque já não ouve os seus administrados, nos parece que dá mais importância à vaidade e ao orgulho. O que estamos vendo é um governante sendo fragilizado publicamente em menos de 10 meses de governo porque ousou a enfrentar não pobres artistas, mas sim a riqueza simbólica da sua própria terra. O prefeito se cerca não mais do povo, mas de vozes que, talvez, invejem o seu lugar.

Antes de ganhar a eleição, fizemos uma entrevista com o prefeito Luciano Almeida (https://www.facebook.com/frentedasculturaspiracicaba/videos/358413385378312) e ele foi categórico ao dizer que construiria as políticas públicas para a área da cultura junto com os artistas, que escolheria o nome do secretário junto com os artistas da cidade, mas não cumpriu absolutamente nada do que prometeu.

Vemos, coitada, a Polícia Federal extremamente constrangida pela promessa de um presente – que já virou uma espécie de maldição, ou melhor, um Cavalo de Tróia. É tão ruim ficar em um lugar onde o próprio lugar não te quer. Já teve essa sensação?

Finalizamos com duas falas da tragédia grega “Antígona” escrita há mais de 2500 anos. A primeira fala é de Tirésias, o velho sábio de Tebas:

“A hora do erro chega a todo ser humano. Mas quem logo a percebe e se corrige é menos tolo, menos infeliz, tem menos culpa. Não apunhala quem já não tem vida. Perdoa o morto. Poupa o cadáver. Só desejo o teu bem, e é por teu bem que falo. Nada mais sábio que aceitar um conselho quando ele vem em nosso benefício.”

E o segundo trecho que transcrevemos é a fala que fecha a peça, dita pelo Coro de Anciãos:

“A vida é curta e um erro traz um erro. Desafiado o destino, depois tudo é destino. Só há felicidade com sabedoria, mas a sabedoria se aprende é no infortúnio. Ao fim da vida os orgulhosos tremem e aprendem também a humildade. Já tarde Creonte se oferece em holocausto. Tebas morre com ele. O inimigo avança.” (Pensando na comunidade cega da nossa cidade gravamos o áudio desse artigo que pode ser acessado em: https://youtu.be/DCOUXgyrfr8 )

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Felipe de Menezes e Teresa Cristina Dip Rossi, integrantes da Frente das Culturas de Piracicaba

 

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