O escárnio do presidente e a Copa da Morte

Thalita Gallucci Sotero

 

 

Até o dia 1 de junho de 2021, nosso país marcou a tenebrosa marca de mais de 465 mil brasileiras e brasileiros mortos em decorrência da Covid19.

Desde o início da pandemia em março de 2020 até o início de junho, já são 16,5 milhões de pessoas infectadas no Brasil, com internações, entubamentos, UTIs, batalhas pela sobrevivência ao vírus e ainda, muitas das vítimas da Covid19, sendo obrigadas a passar por tratamentos médicos pois foram acometidas por doenças ocasionadas em consequência do vírus.

O Brasil está de luto. Segue enterrando mães, pais, avós, avôs, filhas, filhos…. São vítimas de uma doença que até pouco mais de 1 ano era completamente desconhecida para a maioria da população, mas que hoje já tem vacina. Esta inclusive, que foi ignorada por mais de uma dezena de vezes pelo atual presidente da República.

O começo do mês de junho também acena uma outra enorme preocupação já exposta por especialistas das mais diversas áreas médicas e das ciências biológicas: A terceira onda no Brasil de propagação do vírus da Covid19 com as novas CEPAS muito mais contagiosas. Somado a isso, nosso país segue o ritmo de vacinação muitíssimo abaixo do esperado, o que significa que o retorno de volta à “normalidade”, ou seja, circulação e aglomeração de pessoas com um mínimo de segurança, parece ainda distante.

Diante desse cenário, qual lógica racional e que tipo de empatia e/ou sentimento de coletividade e solidariedade com o outro, existe num governo que autoriza ter no seu país a sede de um evento esportivo internacional, onde milhares de pessoas poderão se reunir, ou até mesmo serão obrigadas a se exporem, uma vez que estão trabalhando?

Como por exemplo os próprios atletas, as delegações das seleções e todos os profissionais envolvidos direta ou indiretamente com o futebol. Além disso, não podemos negar que neste cenário, a realização dos jogos ocorrendo aqui em nosso país irá favorecer as reuniões e aglomerações, sejam nas ruas, sejam nos espaços coletivos. O que certamente irá levar ao agravamento dos contágios de uma pandemia que no Brasil já está mais do que descontrolada.

A Copa América inicialmente seria sediada na Colômbia, mas a Conmebol decidiu mudar o local, já que o país vizinho do nosso, enfrenta uma profunda crise política e humanitária, marcada por um governo autoritário, arbitrário, que está retirando direitos dos trabalhadores e das pessoas mais pobres, e que autoriza suas forças de segurança assassinarem manifestantes contrários à suas medidas. Aliás, uma marca histórica da extrema-direita latino americana.

A Argentina, outra nação vizinha do Brasil, foi aventada para sediar o campeonato. Mas a organização da Copa América e o governo de Alberto Fernández decidiram por não fazer o evento no país, uma vez que a pandemia da Covid19 avança sobretudo nas cidades que abrigariam os jogos.

Se o agravamento da pandemia foi motivo suficiente para o cancelamento da Copa na Argentina, e a crise política na Colômbia também fez com que o evento fosse cancelado naquele país, o que dizer da situação brasileira? São em média 2 mil mortes diárias há 6 meses, além de centenas de milhares de infectados pela Covid19 e ainda, com os sistemas de saúde tanto público como privado enfrentando déficit de médicos, enfermeiros e profissionais da área, limitação de leitos, falta de materiais básicos para internação, além das, já expressadas aqui, milhares de mortes diárias ocorridas pela doença.

Não são fatos, dados e argumentos suficientes para que se compreenda que o Brasil não tem condições de abrigar o campeonato?

Além do mais, o que há para comemorar? Que clima temos para abrigar os jogos da Copa América, ou qualquer evento seja esportivo ou de qualquer outra natureza? Há motivações para realização de festas coletivas, eventos de grande porte que invariavelmente tem aglomerações e circulação de pessoas?

O mais assustador, ao nos depararmos com a informação de que o presidente da república autorizou a vinda desse evento esportivo para o Brasil, está no fato da não surpresa.

Especialistas das áreas de Sociologia e História já indicam o neopopulismo e neofascismo como características do governo de Jair Messias Bolsonaro. Usar o futebol, um bem social tão caro e tão presente na vida dos brasileiros e brasileiras, como estratégia política de distração, e ainda, televisionado na rede de televisão cujo dono é o sogro do Ministro de Comunicações do atual governo são posturas que indicam a similaridade estética como os governos que ascenderam o poder na Alemanha e Itália dos anos 20 e 30 do século passado e, que já sabemos muito bem os seus resultados.

 

 

Se de fato a Copa América ocorrer no nosso país, em meio ao agravamento de contaminações e mortes pela Covid19, este governo marcará ainda mais na história do Brasil, a negligência com a saúde e vida, e o escárnio diante da dor e do luto constantes e presentes em cada lar e em cada família brasileira.

Em 1918 o Brasil deixou de sediar a Copa Sul-Americana, que hoje chamamos de Copa América, justamente porque enfrentava a Gripe Espanhola. A história também é professora. E Jair Messias Bolsonaro, já sabemos, não é muito simpático com a História ou qualquer outro estudo que contenha o rigor e a seriedade da Ciência. Mas esperamos que tanto a opinião pública, como o Superior Tribunal Federal, que recebeu pedido do Partido dos Trabalhadores (PT) para suspender a Copa América no Brasil, se atentem aos fatos, aos estudos, e ao cenário avassalador que ainda enfrentamos.

Infelizmente, já vemos que a seleção brasileira de futebol e a CBF nada fizeram para contrapor a decisão de a Copa América ocorrer no Brasil.

E a história da Copa América poderá ser ficar marcada como a Copa da Morte em 2021 no Brasil, que — convenhamos — têm hoje no governo federal, na figura do presidente da República, um dirigente completamente descompromissado com a vida, a saúde e o luto de todos nós brasileiras e brasileiros.

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Thalita Gallucci Sotero, assessora parlamentar no Mandato Coletivo A Cidade É Sua!

 

 

 

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