Lourival Panhozzi
A maior perda que estamos tendo na pandemia, peso que teremos que suportar para sempre, pela imposição/proibição de carregarmos nossos próprios mortos, é a perda do “momento do adeus”.
Nos filmes de ação os heróis abatidos nunca são deixados no campo de batalha, a tropa toda se arrisca para resgata-los. Ninguém quer voltar pra casa com o peso do vazio.
Morte por Covid-19 é, depois do suicídio, a forma mais triste de se perder alguém, é também o meio mais solitário de morrer.
Sou funerário há 45 anos e nunca havia sentido uma energia tão densa entre os enlutados. Saber que, em boa parte, as medidas legais impostas às famílias que perdem um ente querido são desnecessárias ou poderiam ser aplicadas de forma a manter um mínimo de dignidade e respeito, me entristece como profissional e também como enlutado que me tornei pela perda de muitos amados.
O peso do vazio de um adeus que faltou, teremos todos que suportar. O luto que não é vivido, no todo, é por todo tempo sentido.
Como funerário, peço perdão às famílias que não pude permitir (em razão da lei) se despedirem adequadamente de seus amados. Como homem, prometo me esforçar, ainda mais, para recuperar o rito sagrado que marca a deificação daqueles que, de nós, se adiantam na trajetória evolutiva.
Justino Adiriano F. da Silva nos ensina: “Os antepassados — como disse Frei Rovilio Costa —, dos quais somos filhos para a vida e para a fé, não são apenas fragmentos culturais da ação humana no curso da história, mas é a própria humanidade que venceu a peregrinação terrestre.”
Para também vencermos, precisamos manter aceso o respeito àqueles nos antecederam, honrando seus nomes, respeitando sua morte. Eles não podem ser descartados, precisam ser trazidos para junto de nós. Obviamente, que, em um ambiente de pandemia, observados protocolos corretos de segurança, implantados com inteligência e sensibilidade.
Que, nesta vida e na próxima, possamos preservar e expressar o sagrado direito de manifestar nosso sentimento por aqueles que amamos.
____
Lourival Panhozi, presidente do Sefesp (Sindicato das Funerárias do Estado de São Paulo). Colaboração enviada por Carlos Longatto, diretor-presidente do Grupo Bom Jesus e diretor do Sefesp