Razão e apego

Plinio Montagner

Quem não se dispõe a ser imprudente não merece se apaixonar. Shakeaspeare escreveu que o amor é cego, e Nietzsche profetizou que há sempre alguma loucura no amor, e uma razão na loucura.
No palco do amor o interesse por cativar o outro vem primeiro, só depois, a conquista completa o círculo. Mas por que alguns vitoriosos têm a mania de aprisionar o que foi conquistado? Medo de perder ou ausência de confiança?
O ciúme é a falta de confiança no potencial de manter viva a reciprocidade da afeição. Quem não libera seu amor demonstra incompetência para sustentar o afeto conquistado.
Amor de verdade não prende – liberta. Paixões não pensam assim. Razões do amor próprio também equacionam amor próprio ferido.
Por que amamos uma pessoa e não outra? Por que nos aproximamos de alguém e ignoramos outro?
São os mistérios da paixão lembrados num verso da canção – “Aos Pés da Santa Cruz”: “O amor tem razões que a própria razão desconhece”…
Como explicar o fato de uma pessoa bonita, formada nas melhores escolas, inteligente, de família exemplar, com um bom emprego, que domina vários idiomas, que conhece a arte, com um bom saldo no banco e gosta de viajar, com um currículo desses, por que está sozinha? Será por desencanto ou opção?
É claro que na relação amorosa qualidades e defeitos não são créditos nem débitos. Não se ama porque o outro é isto ou aquilo. O amor não possui prudência nem opta por caminhos melhores. Resta à razão lamentar, submissa, é palavra morta.
Amor é assim que funciona: Não se ama nem se rejeita o outro pelas qualidades ou defeitos. Se assim fosse, abstêmios, pessoas belíssimas, jovens, ricas e honestas teriam filas de pretendentes à sua porta.
O sentimento amoroso é uma bala perdida, uma flecha sem destino, sem alvo premeditado. A motivação do romance decorre da química, do magnetismo, do cheiro, do sorriso, da incoerência da desafinação e das notas fora do compasso.
Porque uma moça não despacha o namorado que não emplaca nos empregos, que está sempre sem dinheiro, é impontual, desleixado, vagabundo, que põe a primeira bermuda que encontra e não se lembra de aniversários, mas se derrete quando é tocada por ele?
E o jovem, bonito, com educação esmerada, bem formado, um bom emprego e qualidades que todo sogro deseja para uma filha, o que leva esse jovem a se apaixonar por uma moça cheia de si, petulante, afetada, perdulária, ruim de papo e, talvez, não esplendorosa?
Todas as pessoas têm defeitos, até que se apaixone por uma, disse um filósofo das paixões.
“O amor é como o mercúrio na mão. Deixe a mão aberta, e ele permanece; aperte, e ele escapará”. (Dorothy Parker – escritora americana)
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Plinio Montagner, professor aposentado

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