Poder viral

Camilo Irineu Quartarollo

Não é da China como disseram, já se adaptou e desenvolveu características de cada país, o vírus é mutante, já são novas cepas. Nós temos um vírus brasileiro já, cuidado. Agora pega atleta e está eliminando personalidades de alto a baixo.
Se alguém achou que o vírus é fake enganou-se. Dizem que o vírus encontra suas vítimas que saem de casa, inclusive o Queiroz.
Não faz muito alarde o tal, miudinho, pode ser bem discreto sem nenhum espirro. Pelo jeito é um vírus elitista, pois se a pessoa mergulha no esgoto tudo bem, ele não pega o cara – neste caso, não sei se é porque seja esportista ou porcalhão.
Não é como um raio, este cai duas vezes no mesmo hospedeiro. Se o atleta não se cuidar, é pego também; aliás, ninguém pega o vírus, ele que nos pega.
Não há aquelas vacinas que o postinho lhe dá no braço ou, se preferir, na buzanfa mesmo. Você pode ser a injeção, você produz seus anticorpos se sobreviver à quarentena, ao vírus ou ao governo.
As eleições, ao que parece, não serão suspensas e pode ser que o vírus apoie algum candidato, no amor e na eleição vale tudo, até mentir para o ser desejado. Depois que os palacianos voltaram da visita com o Trump, do jantar na Casa Branca, o vírus estava junto com eles na comitiva presidencial, clandestino, sem passaporte, uniforme, incontinente, incólume, incubado que nem preconceito. Era vírus brasileiro de contrabando este vagabundo ou americano invasor do terceiro mundo. Até então Trump não se preocupava com vírus de fora – “America first”, não afetaria o grande tio Sam, mas quem diz, o inimigo atacou covardemente e ceifa muitas vidas. Até o poderoso Trump se condoeu com os inúmeros sacos pretos que pensou serem… não era hidroxicloroquina, não eram remédios, não eram equipamentos – oh, my God! – eram corpos humanos, da primeira economia do mundo! Não dá mais para negar como fazia o presidente em devaneios virtuais, e agora chama de “war”, guerra, inda que aqui no trópico de capricórnio o nosso presidente chamaria talvez de guerrinha, com ares de onipotência. Narrativas bovinas não matam o vírus, se assim o fosse, eu, pretenso escritor as usaria, mas me confinei, seguindo o rito científico, sem questionar se o Mandetta é ministro do Bolsonaro.
Aqui até os memes estão perdendo a graça, repetitivos, viralizar era uma coisa de internet, de hacker, mas agora qualquer instrumento lhe conecta, fique em casa ou na oca. Se os testes demoram a chegar aos nossos postinhos, o que há de positivo é que não ataca ou destrói fisicamente roupas finas, moedas, dinheiro em papel, dólar. Não ataca, mas lhes atribui o mísero valor que têm, nessas horas, o vírus quebra o ciclo ilusório de valor ou de troca – sua vida vale mais, cara pálida!
O vírus pega somente velhinhos – dizem – esses sessentões como eu, aliás em casa estou.
Não adianta esconder idosos agasalhados ou deixá-los de pijamas listrados e ir à rua trabalhar, pois se você passar o vírus a ele, ele passa para o resto. O seguro morreu de velho, mas não de Corona. Esse regime vertical do presidente brasileiro, hum, não dá não; na verdade, parece mais o semiaberto em que o condenado dorme na cadeia e vai trabalhar durante o dia. Não traga vírus para a sua mulher, seu filho, seus pais, a vítima pode ser você. Fique em casa mesmo.
Até a religião o vírus mudou. É tudo a distância. Se você achava que as pessoas ficavam longe de você, agora pode suar, comer alho e batata doce à vontade, mas fique em casa; se é religioso, feche a porta e reze aos que partem inadvertidamente, pois o vírus se reproduz rapidamente e não dá tempo de os hospitais atender a todos de uma só vez, por isso aguarde. Se você adquiriu anticorpos melhor, mas nem todos os tem e alguns são mais frágeis que você, e estes, precisam do atendimento e respiradores, dê-lhes uma chance, não os contamine.
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Camilo Irineu Quartarollo, Escrevente Judiciário, escritor, diagramador, capista, ilustrador, editor e autor do livro A ressurreição de Abayomi, entre outros

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