Entre a liberdade e a servidão

Antônio Cabrera Mano Filho

 

Uma conhecida expressão brasileira apregoa que, às vezes, estamos mais preocupados em quebrar o termômetro do que em socorrer o paciente. É comum encontrar esse tipo de atitude errônea na política. Muitos justificam os problemas do País devido ao nosso sistema presidencialista, asseverando que a mudança para o parlamentarismo seria nossa tábua de salvação.

No entanto, já tivemos duas vezes esse modelo: no Império e após a renúncia do presidente Jânio Quadros. O primeiro período durou de 1847 a 1889 e o segundo, de setembro de 1961 a janeiro de 1963. Não deu certo! A Itália está quebrada e vive um parlamentarismo instável, cujo resultado é um governo a cada 11 meses nos últimos tempos.

Na realidade, independentemente do sistema político, temos uma distorcida crença universal de que o endividamento do governo aumenta a riqueza do povo, supondo que os burocratas assalariados gastam mais corretamente do que os donos do próprio dinheiro.

É o que constatei no Reino Hachemita da Jordânia, que caminha pela mesma bússola da parlamentarista Grécia, com os seus gastos públicos crescendo de modo muito mais rápido do que a inflação. O seu orçamento subiu de dois bilhões de dinares, em 2000, para mais de nove bilhões, em 2018. É o mesmo sol da gastança pública que nasce no Ocidente e está se pondo no Oriente Médio.

Ou seja, a Jordânia, como já vinha ocorrendo na Grécia, está vivendo às custas de seus filhos. Sim, toda criança nascida hoje herda uma parte da dívida gerada pelo Estado. O déficit público é uma tremenda injustiça intergeracional, pois se trata, a rigor, de um empréstimo das gerações futuras para a atual. É fácil justificar a presente dívida para pagar os projetos que acreditamos sejam necessários, investindo nos segmentos que os gestores do erário consideram pertinentes.

Mas, pergunto, é justo reduzir a capacidade das gerações futuras de pagar por seus programas para que possam financiar nossos desejos atuais? O resultado é que os habitantes do amanhã terão menos recursos para realizar seus próprios empreendimentos, sejam quais forem, incluindo a meta de cuidar dos pobres e necessitados. Você e eu não podemos corrigir eventuais injustiças cometidas pelos nossos antepassados, mas deveríamos interromper o ciclo que prejudicará nossos filhos e netos.

Ou seja, temos de exigir que os políticos parem de gastar um dinheiro que eles não têm, ou pior, recursos que pertencem aos nossos descendentes. O gasto governamental é surdo e mudo, não importando as intenções daqueles que formulam o orçamento público, mas ele é real e será implacável com os jovens que herdarão as dívidas. Jamais devemos esquecer que todo déficit público, seja de um presidente, de um primeiro-ministro ou de um rei, é um roubo ao futuro de nossos filhos.

Thomas Jefferson, o principal autor da Declaração de Independência dos Estados Unidos e terceiro presidente do país, tendo governado de 1801 a 1809, já dizia, há mais de dois séculos, que, “a fim de preservar nossa independência, não devemos permitir que nos sobrecarreguem com a dívida pública (…). Temos de fazer nossa opção entre economia e liberdade ou confusão e servidão”. Pois bem, não podemos cercear o direito das futuras gerações de brasileiros de viverem numa nação sem os ônus de imensa dívida pública, desenvolvida e, portanto, verdadeiramente livre.

 

Antônio Cabrera Mano Filho, médico veterinário pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), com MBA em Agroenergia pela Universidade de São Paulo (USP), empresário rural, foi ministro da Agricultura (1990-1992)

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