Irmãs Paulinas – “É um chamado muito especial”

CRÉDITO: Nassif

Entrevistada do jornalista e radialista João Umberto Nassif desta semana, Helenice Barnez de Moura conta um pouco como é fazer parte das Irmãs Paulinas

 

 

Enquanto o mundo gira entre avanços tecnológicos, choques culturais e transformações sociais profundas, um movimento discreto se espalha em diversas partes do planeta: indivíduos de origens distintas decidem se reunir para repensar o significado de quatro valores que, apesar de antigos, continuam a pulsar com impressionante atualidade — Deus, fé, liberdade e fraternidade.

É como se, diante do ruído das cidades e da velocidade do tempo, essas pessoas tivessem encontrado um refúgio, um lugar onde o espírito pode respirar. O grupo mundial se transforma em uma espécie de encruzilhada humana, onde histórias se cruzam, perspectivas se expandem e vozes diferentes se somam em busca de sentido.

Há quem chegue trazendo perguntas antigas sobre espiritualidade, quem venha buscando coragem para recomeçar, quem encontre ali o apoio que faltava para atravessar momentos difíceis. Outros trazem a inquietação de um mundo dividido e a vontade de reconstruir pontes. Todos chegam com algo a oferecer — e ainda mais a receber.

Ao longo dos encontros, valores que soam quase poéticos ganham forma concreta: a fé aparece na perseverança de quem insiste em acreditar na vida; a liberdade, no direito de existir sem máscaras; a fraternidade, no gesto que acolhe sem perguntar de onde vem; Deus, naquilo que cada um reconhece como mistério, guia ou força interior.

Assim, em meio à complexidade da era moderna, esse grupo internacional se torna uma narrativa viva — uma história sobre humanidade, pertencimento e esperança. Uma história que lembra que, mesmo quando o mundo parece disperso, existem valores capazes de unir terras distantes e corações diferentes.

Helenice Barnez de Moura nasceu em Itaí, município do Estado de São Paulo, com 25.180 habitantes, conforme o censo de 2022. Fundado em 16 de abril de 1874. Situado a 42 quilômetros de Avaré.

Até que idade a senhora morou em Itaí?

Quando eu tinha 4 anos de idade mudamos para Piraju, meu pai foi trabalhar na prefeitura. Meu pai chamava-se Serafim Veloso de Moura e minha mãe Helena Barnez de Moura. Nasci a 9 de fevereiro de 1945.

Quantos filhos seus pais tiveram?

Somos em seis, quatro mulheres e dois homens: Heloisa, Célio, Helenice. Romulo, Walter e Ivete. O meu pai trabalhava na parte administrativa de Piraju.

Até que idade a senhora permaneceu em Piraju?

Aos 14 anos eu fui para o Convento das Irmãs Paulinas em São Paulo. Lá permaneci até completar 16 anos de idade. Voltei para Piraju. Depois voltei para São Paulo novamente, onde permaneci até 10 anos atrás.

Em São Paulo a senhora trabalhou em qual empresa?

Trabalhei na Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô), na área administrativa. Meu local de trabalho era no bairro Santana. Depois fui transferida para a sede, no centro de São Paulo.

No período em que a senhora permaneceu no convento, havia uma revista católica que tinha muita expressão entre as famílias católicas?

Sim! Era a revista Família Cristã! Os calendários eram muito procurados. A revista Família Cristã tem 90 anos de existência no Brasil. Existe a edição digital. As Livrarias Paulinas oferecem muitos artigos ligados a celebrações religiosas.

Esse período em que a senhora permaneceu no Convento foi muito importante?

Sem dúvida! As Irmãs Paulinas têm tradição na divulgação da religião católica, tendo forte expressão na área gráfica, e hoje também nos meios digitais. O Convento situa-se na Rua Domingos de Morais, na Vila Mariana, São Paulo.

A senhora dedicou seu tempo para estudar e junto com outras religiosas, divulgar a doutrina através de livros e revistas?

Sim! Tínhamos uma grade de atividades, sempre com dedicação intensa.

Qual foi o motivo da sua saída?

Para tornar-se uma freira tem que existir uma profunda vocação. Não basta ter uma conduta religiosa exemplar, é um chamado muito especial. Há muitas formas de servirmos a Deus e a humanidade. Existe uma profunda e rigorosa seleção por Irmãs com alto nível de conhecimento vocacional. Fui convidada a tirar um período fora do convento para reflexão. Meu caminho natural foi voltar a Piraju, onde permaneci por dois a três anos. Na época a cidade era pequena, o Rio Paranapanema corta a cidade, voltei para São Paulo que oferecia mais possibilidades de trabalho. Eu tinha me acostumado com a cidade de São Paulo. Permaneci em São Paulo até 2012, depois eu vim para Piracicaba, as minhas irmãs já estavam morando aqui. Eu fazia parte de uma comunidade em São Paulo.

Qual é o nome dessa comunidade?

Chama-se Caminho Neocatecumenal. Cada um morava em sua casa. Encontrávamo-nos duas vezes por semema, na quarta-feira à noite e no sábado à noite, quando celebrávamos a eucaristia na comunidade. Era uma cerimônia separada de quem estivesse na igreja naquele momento.

A senhora chegou a cantar em coral?

Cantava no coral quando eu tinha 14 anos, lá em Piraju. Eu dava aulas de catecismo quando tinha 14 anos, e assim continuei, com 16 a 17 anos eu dava aulas de catecismo para as crianças.

Em Latim ou português?

Em português! Eu cheguei a aprender latim quando estava no ginásio! Cheguei a assistir missas em latim.

O que a senhora acha da mudança da missa celebrada em latim e que passou a ser celebrada em português?

Acho que aproximou mais os fiéis da cerimônia, nem todos estudaram latim! A compreensão das palavras ditas pelo celebrante tornou-se totalmente compreensível. Quando era em latim, o padre celebrava de costas para os fiéis e voltado para o altar, havia algumas vezes nem todos escutavam o que o padre estava falando.

Em São Paulo a senhora cantava em qual igreja?

Na Igreja Santa Margarida Maria, na Rua Lins de Vasconcelos, Vila Mariana.

A senhora chegou a ir ao Vaticano?

Após aposentar-me no Metrô de São Paulo, fui fazer uma viagem pela Itália e estive no Vaticano. Época de João Paulo II. Nós estivemos na cidade de Loreto, onde há uma basílica que abriga a casa da Sagrada Família. É uma basílica bem no alto, fomos a pé. Nessa época eu tinha mais ou menos 59 anos, andamos 20 quilômetros para subir e mais 20 quilômetros para descer. Fomos com muitos jovens, nem sentimos, íamos conversando, cantando. Dentro da basílica fica a casinha onde Nossa Senhora morou. De lá nós fomos para a de Porto San Giorgio, o fundador do Caminho Catecumenal ele é vivo até hoje.

Qual é o nome dele?

Chama-se Francisco Gómez Argüello (Kiko), carinhosamente chamado como Kiko Argüello (no início dos anos 60, Francisco Gómez Argüello (Kiko), um pintor espanhol, Prêmio Nacional de Pintura em 1959, depois de uma crise existencial, descobriu no sofrimento dos inocentes o mistério de Cristo crucificado, presente nos últimos da terra. Esta experiência o levou a abandonar tudo e, seguindo as pegadas de Charles de Foucauld, foi viver entre os pobres de Palomeras Altas). Carmen Hernández, também espanhola, licenciada em Química, formou-se no Instituto das Missionárias de Cristo Jesus. Licencia-se em Teologia com os Dominicanos de Valência e descobre a renovação do Concílio Vaticano II através do liturgista Mons. Pedro Farnés Scherer. Depois de dois anos em Israel em contato com a tradição viva do povo judeu e os lugares da Terra Santa, regressa a Madri com a esperança de formar um grupo missionário para evangelizar os mineiros de Oruro (Bolívia), graças ao então arcebispo de La Paz, Mons. Jorge Manrique Hurtado. Através de sua irmã, entra em contato com Kiko Argüello nos barracos de Palomeras, constrói um barraco sobre o tapume de uma fábrica e começa a colaborar com ele.

A senhora chegou a fazer trabalho voluntário em favela?

Eu fazia parte da comunidade, e na Vila Prudente, em São Paulo, havia uma comunidade também, a mesma ordem da nossa comunidade de Santa Margarida. Fazíamos visitas periódicas, passávamos nas favelas, levantando quais eram as necessidades emergenciais. Sempre procuramos levar algum recurso financeiro, pois sabíamos que iríamos encontrar dificuldades que exigiam soluções imediatas. (N.J. Há casos de absoluta falta de alimentos). Sempre fomos bem recebidos nas favelas. Algumas vezes, colocávamos um determinado valor em dinheiro e colocávamos por debaixo da porta. Eles nem ficavam sabendo quem levava o dinheiro. O Caminho preza pela discrição.

Vocês têm algum apoio do poder público?

Nossas comunidades se ajudam mutuamente a nível mundial.  Não há nenhum tipo de ajuda governamental. Em Piracicaba abriu agora uma comunidade. O Bispo da Diocese de Piracicaba apoiou a vinda de uma unidade do Caminho para Piracicaba. Isso já faz três anos. Tem uma segunda comunidade na Igreja São Francisco no Bairro Jupiá.

A Igreja Católica passa por um momento de diminuição do número de fiéis ou é impressão?

A meu ver, talvez por estar em contato constante, percebo que há muita fé e muitos fiéis. Mesmo em locais remotos, as manifestações são expressivas.

Um marco de fé no coração do Cariri: nasce o maior monumento dedicado à Nossa Senhora de Fátima. Moradores da cidade do Crato e de toda a região do Cariri, no Sertão do Ceará, celebraram com fé e devoção a festa que celebrou a inauguração do monumento de Nossa Senhora de Fátima, com 54 metros de altura, considerado o maior do Brasil e o maior do mundo em homenagem a Santa. Mais de 100 caravanas marcaram a presença para peregrinar até o local em que foi elevado o santuário, segundo o bispo diocesano. O Caminho Neocatecumenal é uma renovação do batismo! Inclusive eu fui para Jerusalém, em 2014, com a minha Comunidade de São Paulo. Fomos ao Rio Jordão renovar a promessa de batismo. Em Jerusalém fomos a mais de 50 lugares, todos lugares que Jesus percorreu, Maria, São José, nós fomos!

E qual foi a sensação em estar vivenciando esses lugares?

Foi uma sensação muito boa! Pena que no ano passado, a minha comunidade de São Paulo foi percorrer a última etapa. Eu teria que ir. Acabei tendo que permanecer em Piracicaba para resolver situações praticas.

A senhora pretende voltar para Jerusalém?

Pretendo! No ano que vem tem uma outra comunidade que vai para lá. Pretendo ir junto! Uma curiosidade histórica de Israel. Havia duas cidades cujos nomes eram muito similares e causavam confusão: Nazaré (em hebraico, Nazareth), a cidade histórica, conhecida por ser o local onde Jesus passou a infância. É a maior cidade árabe de Israel. E Nazaré Illit (Colinas de Nazaré): uma cidade israelense separada, fundada em 1957.

Para evitar a confusão, em 2019, os moradores de Nazaré Illit votaram para renomear a cidade para Nof Hagalil (Vista da Galileia, em hebraico).

Portanto, atualmente não há duas cidades com o mesmo nome em Israel.

Em Piracicaba quantas pessoas participam da comunidade?

Quando foi fundada éramos em 30 pessoas. Tinha uma pessoa que caminhava no Peru, veio estudar na Esalq e passou a frequentar. Gente de São Paulo que veio morar aqui, também entrou. Tinha vários casais de Jundiaí. Atualmente devemos ter uns 25 que frequentam a Catedral e na Igreja São Francisco uns 30.

A senhora usa internet?

Sim! Uso. Nós temos um canal: Caminho Neocatecumenal: https://neocatechumenaleiter.org/pt-br/. Temos intercâmbio com outros países.

Caso a pessoa queira participar do Caminho, há alguma seleção prévia?

Existe uma avaliação natural do interesse da pessoa, ela passa por uma catequese, mostrando-se de fato interessada em seguir o Caminho, não são discriminadas por classe social, cultural ou financeiro. Um mendigo pode mostrar interesse e participar, desde que tenha as condições mínimas necessárias para a convivência.

Essa obra da qual a senhora faz parte está em expansão?

Já temos cerca de 70 seminários! Kiko teve apoio de todos os Papas, desde que iniciou seu trabalho na década de 60.

A senhora dirigiu a sua vocação religiosa de uma forma que  está servindo a Deus e ao próximo dentro de uma concepção inovadora ou talvez até mesmo pioneira.

Acredito que sim!

A senhora não se sente só?

Como poderia me sentir só se tenho 25 irmãos de comunidade que encontro todas as semanas? Sem contar que tenho ao meu lado meus irmãos de sangue, parentes, amigos! Geralmente quando saio à noite, passo pela portaria e digo  em tom de brincadeira: “Eu estou indo para a Catedral, não estou indo para nenhum baile não!”. Tinha um porteiro, que já não trabalha mais aqui, ele era de uma outra religião. Mas se adiantava e dizia: “Já sei! A senhora está indo para a catedral! Reze por mim!”

O que fica bastante perceptível, é que é um movimento dentro da Igreja, com algumas décadas de existência, não muito conhecido, mas que conta com pessoas muito bem direcionadas com relação a direção e decisão que tomaram.

 

 

 

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