Vicente de Paulo da Silva
O governo Lula completou seus primeiros 100 dias de atuação nesta semana, muito embora saibamos que o ex-presidente, derrotado, abandonou o país bem antes do término de seu mandato em direção aos Estados Unidos, deixando vaga a presidência da república. O centésimo dia de um governo é uma data meramente simbólica, não incidindo maiores considerações institucionais. Assim sendo, é importante destacar que o Brasil, tão maltratado durante o último quadriênio da gestão do atraso, agora retoma sua condição humana e sobretudo iluminista e republicana, pondo fim ao período mais obscuro, arcaico e desumano na história da Nova República.
Jamais houve gestão que gerou tamanha expectativa e cobrança em seus primeiros meses. Sobretudo porque o que se havia antes era uma não-gestão. Conforme constatou o vice-presidente Geraldo Alckmin, o governo anterior entregou o Estado sem atualizar dados básicos da gestão pública, comprometendo o trabalho da equipe de transição e prejudicando a vida dos brasileiros e brasileiras. No campo econômico, a inexplicável intransigência da autoridade monetária e sua insistência na manutenção indefensável da taxa de juros mais alta do mundo, dificultando o investimento e travando o crescimento do Brasil. No campo político, a postura antirrepublicana e de baixíssimo nível da oposição da extrema direita, que decidiu apostar no “quanto pior melhor” e já indicou que fará de tudo para prejudicar o país com a intenção de dificultar o governo.
A competência e a liderança do presidente Lula e seu time de ministros tem contornado todas as dificuldades herdadas. Incluindo uma tentativa malograda de golpe na invasão que depredou a sede dos poderes no dia 08 de janeiro. Apesar das circunstâncias históricas complexas de um país divido, uma guerra de grandes proporções em curso, mudanças globais importantes no cenário político, econômico, social e tecnológico, os três primeiros meses do terceiro mandato de Lula foram marcados por grande êxito concreto nos âmbitos social, político e econômico.
O retorno do Bolsa-Família, com distribuição de valores a partir de R$ 600,00 (previsto no orçamento federal somente até dezembro de 2022 pelo governo anterior). Retomada do Combate à fome por meio do retorno do Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, extinto em 2019). Retomada do programa Mais Médicos e das campanhas nacionais de vacinação, (em detrimento ao pensamento antivacina e anticiência). Volta do Minha Casa, Minha Vida. Na educação, reajuste de 200% para bolsistas e pesquisadores, bem como aumento substancial no investimento público em pesquisa e inovação. Reativação do Fundo Amazônia e retomada da luta contra o desmatamento, através do aumento da fiscalização contra garimpos ilegais. A proposta de arcabouço fiscal, elaborada pelo ministro Fernando Haddad, que trará segurança para o governo realizar os investimentos necessários para a retomada do crescimento, ainda que a demagogia da oposição radical, que ainda não superou o resultado eleitoral, não permita enxergar.
Além dessas e de outras ações simultâneas, é importante destacar ainda a criação do Ministério dos Povos Originários, a retomada do protagonismo e do prestígio do Brasil no exterior, a melhora significativa nas relações institucionais entre a presidência da república e os poderes constituídos, em todos os níveis da federação, que são méritos incontestáveis de Lula. Um governo cujo desafio histórico consiste na reconstrução da democracia e na reorganização da institucionalidade nacional.
O maior avanço que Lula alcançou nesse início de mandato, todavia, foi civilizacional. A maior vitória do governo foi devolver ao Brasil a sua humanidade enquanto país. E humano que é, o governo também comete equívocos. Mas não há compromisso com o erro, nem pacto com a censura. Não existe apreço pela tortura, tampouco pela mentira. Não compactuamos com gabinetes do ódio, e não vivemos mais na idade das trevas. Como bem disse Lula em seu discurso de posse, a Terra é redonda. E seu governo é o governo-luz. A luz para todos que retirou o Brasil da idade das trevas.
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Vicente de Paulo da Silva, Vicentinho, deputado federal, advogado, professor de Direito Constitucional