Vacinas e o conceito de imunidade, uma viagem no tempo

José F. Höfling,

 

O conceito de imunidade (estar imune ou  protegido contra doenças ) pode ter existido há muito mais tempo do que supomos, conforme sugere o antigo hábito chinês de tornar as crianças resistentes à varíola ( uma das doenças mais antigas e vorazes que apareceu e foi responsável pela morte de milhares de indivíduos no mundo, atualmente erradicada ), fazendo-as inalar pós obtidos de lesões cutâneas provenientes de pacientes em recuperação dessa doença, vejam só…Foi a partir do conceito de Imunologia (resposta orgânica) que, pela primeira vez, a medicina foi capaz de demonstrar a “possibilidade” de intervir no curso de uma doença.

Os primeiros indícios de interferência na saúde de humanos fizeram-se por meio de um instrumento imunológico: a vacina! Eduard Jenner (1749-1823) foi o pioneiro no processo de criação da vacinação. Logo, a compreensão da “imunização e da proteção” surgiu no final do século XVIII, bem antes de se conhecer os microrganismos, quando foi criada por “Louis Pasteur” a teoria dos germes, no final do século XIX. A partir desse momento começava a relação das doenças com os microrganismos… Jenner, o qual foi discípulo de John Hunter, era médico de província e um exímio médico experimental. Em sua época, a varíola era uma ameaça constante à população, sendo responsável, na Inglaterra, por um óbito em cada sete crianças. As crianças que sobreviviam à varíola herdavam sequelas graves.

Curiosamente, Jenner observou que, em vacas, a varíola (cowpox ou vacínia) também se manifestava, porém, de uma forma bem mais branda e diferente da forma humana (smallpox), era a manifestação por meio de pústulas no úbere (bolinhas com pus que podem aparecer na pele), cujas infecções eram passadas para as mãos e os braços das pessoas que trabalhavam na ordenha. Entretanto, essas pessoas não adoeciam subsequentemente com a varíola…a mãe natureza nos ensinando…

Após alguns anos de convívio com o fato, e fazendo observações científicas (graças à curiosidade humana), Eduard Jenner injetou pus das lesões do cowpox (varíola das vacas) em uma criança de 8 anos…Quando essa criança foi intencionalmente exposta ao pus da varíola de indivíduos gravemente doentes, a doença não se desenvolveu!! Repetindo em adultos e percebendo que os indivíduos não adoeceram também, Jenner submeteu seus resultados a Royal Society. Graças à esses supostos “arrobos” de comportamento científico é que estamos vivos hoje…

Hoje não submetemos nossas pesquisas à Rainha, mas a revistas científicas da área, como o fazem todos os cientistas. Essas descobertas levaram a metodologias de prevenção à doença permitindo uma prática de vacinação, cuja palavra tem origem grega em vacca, dando origem ao nome vacínia, que levou a palavra vacinação, que é o significado do processo de imunização. Então, a vacinação com base científica não é algo que surgiu de uma varinha mágica, mas de um esforço contínuo de indivíduos que trabalharam arduamente e tiveram a coragem de ir até o fundo dessas questões e de seu entendimento do ponto de vista biológico, deixando de lado explicações simplificadas e dogmáticas. Surgiam as vacinas, que ao longo dos séculos foram se aprimorando com base tecnológica, e hoje temos avanços significativos no processo de vacinação.

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José F. Höfling, da Unicamp, biólogo, microbiologista e Imunologista

 

 

 

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