Semae – Para CPI, fiscalização do contrato com a Mirante é mera formalidade

Schiavuzzo foi responsável pela contratação da Mirante através de PPP, em 2012. Foto: Fabrice Desmonts

O ex-presidente do Semae (Serviço Municipal de Água e Esgoto), Vlamir Schiavuzzo, confirmou à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), criada na Câmara Municipal de Piracicaba para apurar possíveis irregularidades na autarquia, que a empresa Mirante nunca recebeu penalidades por infrações ao contrato em sua gestão, de 2005 a 2016. Ele foi convocado para prestar depoimento à comissão nesta segunda-feira (7) porque a PPP (Parceria Público-Privada) foi firmada em 2012, quando a Mirante passou a ser responsável pela execução do sistema de esgoto do município. Apesar de ser considerado um ponto chave para a investigação, o depoimento foi marcado pela esquiva do ex-presidente, que disse não se lembrar de várias informações ao ser questionado pelos vereadores.

Os membros da CPI, Rai de Almeida (PT), presidente; Anilton Rissato (Patriota), relator e o membro Thiago Ribeiro (PSC) continuam a investigar a relação entre uma fiscalização deficitária do contrato com a empresa Mirante e os problemas já identificados na execução do sistema de esgoto, como despejo irregular de resíduos nos mananciais.

“É um contrato que não tem fiscalização, só tem uma fiscalização pró-forma”, avaliou a presidente da comissão. “O que a gente percebe é cada um lavando as mãos e pouco se lixando com a responsabilidade na fiscalização do contrato. Com isso, a Mirante nada de braçada, faz o que quer, com resultados financeiros, às nossas custas”.

No depoimento, o ex-presidente do Semae relatou o funcionamento da Equipe Multidisciplinar responsável pela fiscalização do contrato, indicada por ele e cujos membros já foram ouvidos pela CPI. Cada integrante faz os apontamentos referentes à sua área de atuação e um relatório final é encaminhado mensalmente para a presidência da autarquia. No entanto, Schiavuzzo confirmou que não foi necessário aplicar nenhuma penalidade à Mirante ao longo dos anos de execução do contrato na gestão dele.

Segundo o ex-presidente, todas as irregularidades apontadas pela equipe no período foram sanadas pela empresa. Ele também não soube dizer quem é o responsável pela aplicação das penas, como advertência e multa, mas garantiu que sempre reportava ao prefeito todas as decisões referentes ao Semae. Nos depoimentos da Equipe de Fiscalização, a informação obtida pela CPI é que a penalização estaria a cargo do Poder Executivo. Os membros da equipe também não souberam dizer o que acontece após o envio dos relatórios.

“A Mirante era comunicada previamente dos problemas e corrigia. Em todos esses anos de contrato, não teve nenhuma advertência. Esses problemas não são registrados e nem há penalização”, constatou Rai de Almeida (PT). “Sabemos de inúmeras irregularidades nesses 10 anos de contrato, mas o órgão competente não faz a fiscalização. É uma parceria que tem uma relação de boa vizinhança, uma relação de compadrio, um faz favor para o outro”.

O ex-presidente ainda contradiz as informações apresentadas pelos membros da Equipe de Fiscalização e técnicos da autarquia em depoimentos à CPI. Todos os depoentes negaram participação na elaboração do contrato, mas Schiavuzzo nomeou todo o corpo técnico envolvido no processo. Ele disse ainda que os termos do contrato foram redigidos pela procuradoria jurídica do Semae com auxílio dos advogados da Prefeitura.

Schiavuzzo ainda disse desconhecer o problema dos extravasores de esgoto, que são usados para desvio dos resíduos sem tratamento para os mananciais, conforme identificado em vistorias realizadas pela CPI. “Não são extravasamentos pontuais que estamos vendo”, relatou Rai ao depoente. “Salvo melhor juízo, há uma burla do ponto de vista do desvio da tubulação que vem do poço de visitas”. Ela lembrou que o despejo de um grande volume de esgoto sem tratamento nos corpos d´água tem sido permanente e é um problema antigo. Para o ex-presidente, se existe o problema, ele deve ser corrigido.

SEM ALTERNATIVA – Segundo Schiavuzzo, o município não tinha alternativa, a não ser a contratação da PPP. Ele disse que havia um TCAC (Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta) firmado com o Ministério Público, que estabelecia o prazo até 2008 para tratamento de 100% do esgoto do município, sob pena de multa. Ele disse ter procurado linhas de crédito para a execução das obras, sem sucesso. Por isso, optou-se pela PPP, que previa um investimento inicial de R$ 330 milhões pela empresa parceira. Segundo o ex-presidente, o prazo de 30 anos para a parceria foi estabelecido para que a autarquia tivesse tempo suficiente para pagar pelos investimentos que, segundo ele, já ultrapassaram os R$ 400 milhões atualmente.

Ele defendeu, no depoimento, que a PPP foi benéfica para a cidade, já que nem todo o faturamento do esgoto é repassado para a Mirante, o que garante uma margem de investimentos para o Semae. O ex-presidente pouco comentou ao ser questionado sobre a falta de repasse da inadimplência para a Mirante, conforme já identificado pela CPI. “A responsabilidade pela inadimplência é do Semae. A Mirante é responsável pelo tratamento de esgoto”, disse.

PERDA DE DADOS – A situação financeira da autarquia também foi questionada pelos parlamentares, ao abordarem as longas listas de instituições isentas do pagamento da tarifa e de consumidores inadimplentes. O ex-presidente confirmou o episódio em que uma queda de energia no sistema de informática do Semae resultou na perda de dados de parte dos devedores. Segundo ele, uma funcionária teria se aproveitado do momento e alguns itens se perderam do cadastro. “A maioria desses dados nós recuperamos, mas alguns foi impossível recuperar”, afirmou. Schiavuzzo citou ainda que a área de informática “tem dessas coisas” e lembrou que já perdeu fotos e informações do celular por causa de alguma pane. Ele não soube dizer se houve alguma penalização interna pelo episódio.

No depoimento, Schiavuzzo também prestou esclarecimentos sobre duas viagens ao exterior – Espanha e Alemanha – custeadas pelos cofres públicos. O ex-presidente disse que conheceu inovações no sistema de tratamento de esgoto e de otimização do processo de leitura dos hidrômetros, além de conferir equipamentos comprados para as estações da autarquia. “Essas visitas ao exterior foram irrelevantes, não trouxeram resultados inovadores”, avaliou a presidente da CPI. “O que foi visto nos outros países que resultou na conclusão de que deveria contratar uma PPP?”, questionou.

Ao final do depoimento, o ex-presidente do Semae se desculpou por não se lembrar de todos os detalhes questionados pelos vereadores. Ele justificou que se passaram muitos anos desde que deixou a autarquia e que não fez mais o acompanhamento do trabalho desenvolvido. Para o relator da CPI, vereador Anilton Rissato (Patriota) o depoimento de Schiavuzzo pouco acrescentou à investigação, já que ele garantiu desconhecer ou não se lembrar de vários detalhes. A próxima oitiva a ser realizada pela CPI do Semae está prevista para quinta-feira (10), quando serão ouvidos representantes da Ares-PCJ (Agência Reguladora dos Serviços de Saneamento das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí).

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