Rubens Santana de Arruda Leme
Era uma vez uma frondosa árvore, esquecida na última esquina da rua Moraes Barros sentido Cemitério da Saudade, sob a qual moradores e comerciantes da vizinhança acumulavam lixo. Eventualmente, na primeira metade da década de noventa, nós vendedores da Cabo Total, empresa que iniciou a transmissão de TV à cabo em Piracicaba, comemorávamos na sombra da sua imensa copa, sob o olhar curioso dos passantes, as vezes em plena segunda –feira, o fechamento das vendas do mês.
Mais tarde, comerciantes do final da Moraes, começaram a realizar naquela espaço, ainda pouco notado, as festas juninas que ficaram conhecidas como “Arraiá do Arvão”.
Em 1995 surgia no bairro o semanário Gazeta da Cidade Alta, de propriedade do casal Paulo Sérgio Tomaziello, o Kerko, e Maria da Graça Arruda Tomaziello. A Graça, como a chamávamos, para nossa tristeza faleceu recentemente. Fica aqui nossa homenagem a essa grande mulher.
Morador do Bairro Alto que sempre fui e interessado na divulgação das suas histórias e tradições, logo me engajei nessa ousada empreitada, fazendo parte do setor comercial e também junto ao conselho editorial, do qual faziam parte além dos proprietários, Maria Araújo(in memoria), Adolfo Queiroz, Rogério Aquiles, Carlinhos Gonçalves, Esio Pesatto, entre outros (as) que me fogem à memória.
O jornal teve uma aceitação tão grande devido a sua inserção exitosa na cultura e na vida comercial do bairro, que certa vez Luiz Carlos Furtuoso, proprietário do “Ao Zequita “ tradicional estabelecimento comercial bairro altense, comentou que a Gazeta havia transformado o Bairro Alto num grande parque de diversões.
Mas foi no campo cultural, que a Gazeta deixou seu nome marcado para sempre na história do Bairro Alto.
Tendo como catalizador o jornal com a participação de toda a sua equipe e moradores(as) do bairro, trintões e quarentões à época, provavelmente inspirados pela chegada iminente do novo século, voltaram no tempo e imbuídos de uma romântica e sonhadora jovialidade, resolveram no Natal de 1996 cobrir de luzes a majestosa sapucaia, surgia o grande ícone do Bairro Alto, nascia o Movimento Cultural Sapucaia.
Por mais de uma dezena de anos, esse grupo de jovens senhores (as), levou aos moradores da região, especialmente os residentes no entorno do Estádio Municipal, muita alegria e entretenimento. Era o renascer das tradições desse bairro tão querido desde o Bosque do Barão de Serra Negra.
Foram festas juninas, torneios de truco, bingos comunitários, em parceria com a prefeitura municipal revitalizamos as praças Bonga e Daniel e a Cicero Corrêa dos Santos (Praça da Sapucaia), onde renomados artistas, alguns do próprio bairro, criaram a primeira pinacoteca a céu aberto da cidade. Foram anos dourados do nosso bairro, éramos felizes e sabíamos.
Porém, a joia rara dessa época inesquecível foi a criação da Banda da Sapucaia em fevereiro de 1997. A Banda envolveu os(as) foliões de toda a Piracicaba e também de cidades vizinhas. Comenta-se que turistas de outros estados e até de outros países vieram curtir a banda que chegou a ter quarenta mil participantes, transformando a Moraes Barros numa imensa passarela do samba. Antigos carnavais foram relembrados de forma livre e descontraída, por pessoas de todas as idades e classes sociais num congraçamento nunca visto em nossa cidade. Encontros e reencontros se multiplicavam no dia do desfile, amores de carnaval se transformaram em casamentos, em meio a multidão que como flores coloridas descia a Moraes na contramão da tristeza.
Para um evento que começara com não mais do que meia centena de mambembes foliões(ãs), o crescimento foi exponencial. Certa vez vaticinei na ata da reunião da antiga comissão organizadora, que se acha sob a guarda do nosso querido “presidente” Étão Carraro, que corríamos o risco de morrer afogados pelo sucesso, se não formássemos o mais breve possível, uma diretoria juridicamente constituída, composta pelos criadores do nosso movimento cultural. Infelizmente, não conseguimos tomar essa medida a tempo, sendo essa a principal causa de não tornarmos o nosso movimento permanente e cada vez mais grandioso. Mal entendidos, vaidades, preconceitos e , até mesmo oportunismos, falaram mais alto.
A Banda desfilava sempre no sábado anterior ao do carnaval, no último dia 19 de fevereiro, a Banda faria vinte e cinco anos. A pandemia impediu que oque restou da inesquecível confraternização carnavalesca acontecesse nos dois últimos anos. Porém o caráter de movimento cultural já não existe, praticamente a maioria dos seus criadores não mais participa da organização e ainda cometeram o aborto cultural de tirá-la da Moraes Barros, do Bairro Alto, ficou a saudades !
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Rubens Santana de Arruda Leme, técnico químico industrial, supervisor de higiene e segurança do trabalho, representante comercial autônomo e um dos criadores do Movimento Cultural Sapucaia (e-mail: rubenssal @ibest.com.br)