Do direito – garantia – de fuga assegurado ao cidadão

Cíntia Gomes Balotta

 

Com o escopo de verter luzes e carrear elementos denunciadores da desnecessidade de decretação de carcer ad custodiam, de modo que reste denunciado os abusos daí decorrentes aportamos firme escólio: “(…) não se conduz o homem para o bem com o terror. Deus lhe concedeu a razão e a aspiração da justiça para que com elas se fortalecesse na luta contra as paixões perversas.

A razão, a simpatia, os sentimentos nobres e generosos, o exemplo, são o arsenal infalível no que deve ter fé todo aquele a quem lhe toque o pesado ofício de governar as multidões pelo caminho do Direito. (Franceso Carrara)” (“in” Rogério Schietti Cruz. Prisão Cautelar, Jus Podium, Bahia, 2020, p. 26)

De cediço e comezinho conhecimento que ninguém está obrigado a submeter-se a custódia cautelar pessoal que repute ilegal, para ao depois  discuti-la, no que tem toda razão a Defesa e o Paciente, dado claudicar em tudo a construção da prisão processual atacada; neste sentido a Jurisprudência:

“Cabe sublinhar, ademais, o seguinte: não é justo nem razoável exigir a prisão     do sujeito para que ele possa discutir ou questionar a validade do decreto coercitivo. A máxima Corte do Judiciário brasileiro vem enfatizando que “agride à garantia da tutela jurisdicional exigir- se que, para poder questionar a validade da ordem de sua prisão, houvesse o cidadão de submeter-se previamente à efetivação dela” (STF, HC 84.997-1/SP, rel. Min. Cezar Peluso)

Aquele que tem contra si decretada uma prisão cautelar tem Garantia a que a sua legitimidade seja analisada  pelo Juízo ou Tribunal, independente da condição que ostenta em relação à sua liberdade, se plena, ameaçada ou conspurcada.

Todavia, “quando essa ordem apresenta-se como ilegítima, também não há como questionar a possibilidade de  contestação do agente, o qual não está obrigado a se sujeitar à prisão para perquirir sobre a lisura do decreto prisional.” (Alberto Z. Toron, em artigo publicado no Boletim IBCCRIM n. 149, abril de 2005)

Nesta picada, a Doutrina balizada do    Mestre Luigi Lucchini, em Clássica obra:

“Fuga de Demóstenes embora inocente para se salvar da incerteza do julgamento – fuga de Moisés sem culpa por medo de seu povo agitado e impetuoso – fuga de Davi da perseguição de Saul que seu filiou de Absalão …- justiça humana; visto que também é próprio do inocente temer a justiça dos homens. A fuga, disse Montesquieu, é companheira do medo frio, mas não da culpa; porque se não há fuga sem medo, há medo sem culpa. E até que as formas opressivas sejam removidas, o horrível sistema de perseguir o indivíduo sem prova de sua delinquência, sua fuga ou tentativa de fuga não pode ser considerada como prova ou evidência de culpa. (Luigi Lucchini. Il Carcere Preventivo, Dal Prem. Stabil.” Tip. di P. Naratovich, Venezia, 1872, pág. 129)

“Fuggi Demostene sebbene innocente per salvarsi dall’incertezza del giudizio – fuggi Mosé senza colpa per timore del suo popolo eccitato e firibondo – fuggi Davide dalla persecuzione di Saul e di Assalonne suo filiou …. – fuggirono innumerovoli sventurati onesti onde sottrarsi alla persecuzione della umana giustizia; poichè è proprio anche degli innocenti temere la giustizia degli uomini. La fuga, disse Montesquieu, è compagna del timor freddo, ma non della colpa; perchè se non vi è fuga senza timore, v’e è timore senza colpa. E sino a che non verranno tolti i modi vessatori, l’orribile sistema di perseguitare l’individuo senza la prova della sua delinquenza, non si potrà ritenere la sua fuga od il tentativo di fuga come prova o indizio de colpabilità.” (Luigi Lucchini. Il Carcere Preventivo, Dal Prem. Stabil. Tip. di P. Naratovich, Venezia, 1872, pág. 129)

Na tensão entre o ius puniendi e o ius libertatis, iniludivelmente há de prevalecer e soçobrar a Garantia da Liberdade do Cidadão:

“(…) e o princípio firme e inconteste que agora estabelecemos aqui, como se pode deduzir do exame completo do fundamento, dos interesses e dos fins processuais, é precisamente aquele segundo o qual, no conflito entre os dosi interesses fundamentais do processo, deve preferencialmente, garantir a proteção da liberdade e da inocência.” (Luigi Lucchini, Elementos do Processo Penal, Editora G. Barbèra, Florença, 1899, páginas 16-17)

“(…) e il principio fermo e inconcusso da noi ora qui fissato, quale si desume dall’esame integrale del fondamento, degli interessi e dei fini processuali, è appunto quello secondo cui, nel conflitto fra i due fondamentali interessi del procedimento, debba preferibilmente provvedersi alla tutela della libertà e dell’innocenza.” (Luigi Lucchini, Elementi di Procedura Penale, Editore G. Barbèra, Firenze, 1899, pág. 16-17)

Fundamento outro desavizadamente utilizado de modo descuidado, nada cioso, refere-se à gravidade em abstrato do injusto, que repise-se, de todo frágil e pueril, não possuindo o condão de conferir validade e eficáciaa nenhum Édito que pretenda estiolar o plexo de Direitos e Garantias Fundamentais do Homem, segue a Doutrina:

“Um dos fatos que mais perturba a justiça – diz  Rafael Bielsa -, é a paixão pública, que se manifesta como uma impaciência doentia e ávida pelas sensações, as massas sempre querem um responsável e experimentam certo bem-estar quando é colocado no pelourinho algum    personagem.” (Arturo J. Zavaleta. La Prisión Preventiva y la Libertad Provisoria, Ediciones Arayú, Buenos Aires, pág. 68)

“Uno de los hechos que más pertuba la justicia – dice Rafael Bielsa -, es la pasión pública, que se manifiesta como impaciencia enfermiza y ávida de sensasiones; las masas quieren siempre un responsable, y experimentan cierto bienestar cuando se pone en la picota a algún personaje.” (Arturo J. Zavaleta. La Prisión Preventiva y la Libertad Provisoria, Ediciones Arayú, Buenos Aires, pág. 68)

O juiz não está autorizado a julgar com os ouvidos  e olhos dirigidos às janelas, posto que, assim fazendo-o comprometerá seu cociente de Imparcialidade Objetiva, plasmando-se o que Arturo Zavaleta, prodigiosamente chamou de “impaciência enfermiça”; nesta seara consagrada Doutrina:

“Em face de um juiz de imaginação ardente pode um outro habituado apesar todas as cousas com calma e madureza, e o resultado será bem diverso.

(…)

(…) se o juiz é tímido, se imagina constantemente que está iminente uma revolução, se supõe em perigo a ordem publica, só porque percebe como que symptomas de um movimento extraordinário nos espíritos, promptamente certas demonstrações, os actos de muitas pessoas lhe parecem ameaçadoras e caracteristicos de más intenções contra o Estado;(…) um juiz mais bem avisado, que ame a liberdade e o movimento no dominio da inteligência, e honre a independencia do pensamento, só cogita no perigo quando o tem presente.

(…)

O fiel da balança da consciência, para ainda nos servimos desta conhecida metáfora, hesita antes de firmar-se, e seus movimentos estabelecem a proporção entre as razões de acreditar ou não acreditar nos factos em questão.” (Carl Joseph Anton Mittermaier. Tratado da Prova em Matéria Criminal, Eduardo & Henrique Larmmert, RJ, 1871, p. 73-74)

No lanço de Liberdade do Cidadão, o mínimo toque já enseja macula decorrente da ofensa frontal ao devido Processo Penal e seus corolários, de modo que qualquer Decisão que pretenda-se baldramear-se nestas nefastas colunas da atrabiliariedade não poderão prosperar e ganhar ares de incolumidade, devendo-se afastar estas praticas adotadas, via de regra em todos os rincões do País, devendo emergir sim a temperança ao se investigar a presenção dos requistos para a decreteação de todo e qualquer carcer ad custodiam. Por tal nos batemos, em insenssante luta!

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Cíntia Gomes Balotta, advogada, do escritório Mastrella & Balotta Advogados

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