José Osmir Bertazzoni
A última sessão da Câmara de Vereadores de Piracicaba, ocorrida nesta segunda (18), foi mais uma daquelas atividades mornas do legislativo, em que se sobrepuseram os vereadores verborrágicos, que agridem cidadãos, atacam sindicatos, defendem as OSS (organizações sociais) e tratamento precoce para Covid-19, e afirmam que a distribuição gratuitas de absorventes nas escolas e redes de saúde é desperdício de dinheiro, “No tocante ao absorventes, nós temos que nos preocupar mais com a merenda escolar, as mulheres possuem outras necessidades…”, como disse Fabrício Polezi.
São situações como essas que realmente nos trazem uma certa preocupação, pois acreditar que a Terra é plana e receitar Kit-Covid-19 como tratamento precoce configuram neuropatologia irreversível, usual dos defensores do governo Bolsonaro. O que não nos traz compreensão é o fato do vereador Fabrício Polezi sustentar a importância do tratamento precoce sem eficácia para a Covid-19 e ignorar a importância da distribuição de absorventes para garotas e mulheres de forma a garantir um mínimo de dignidade, principalmente às mais carentes jovens adolescentes em fase escolar e às mulheres pobres.
Segundo matérias jornalísticas que relatam estudos importantes, há perfeita compreensão que seis em cada dez meninas no mundo deixam de ir à escola quando estão menstruadas. No Brasil, a situação se agrava, estima-se que seja uma em cada quatro meninas. Tudo se agrava com a falta de condição financeira para adquirir absorventes e, principalmente, de estruturas sanitárias adequadas com duchas higiênicas, que compõem as causas de um problema conhecido e reconhecido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) como pobreza menstrual. Muitas meninas utilizam-se de jornal, pedaços de pano, pão envelhecido e até sabugo de milho são usados de forma improvisada no lugar de um absorvente para conter a menstruação, uma afronta ao princípio da dignidade humana.
A deputada Marília Arraes (PT-PE), através do Projeto de Lei (PL) 4.968/2019, cria o Programa de Fornecimento de Absorventes Higiênicos (PFAH) nas escolas públicas, pelo qual serão ofertados absorventes aos anos finais de ensino fundamental e ensino médio. A intenção é combater a pobreza menstrual, que significa a falta de acesso ou a falta de recursos para a compra de produtos de higiene e outros itens necessários ao período da menstruação.
O texto aprovado estabelece que serão beneficiadas principalmente as estudantes de baixa renda matriculadas em escolas da rede pública de ensino. Também receberão o produto mulheres em situação de rua ou de vulnerabilidade social extrema, mulheres presidiárias e adolescentes internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa. A faixa etária varia de 12 a 51 anos.
A importância deste projeto é entender as necessidades reais das mulheres em todo universo social, estimular a educação e orientar sobre higiene adequada, garantindo-se assim condições como banheiros, duchas higiênicas, absorventes de qualidade e respeito às mulheres.
Vivemos em uma sociedade machista, dominante na política, em que a compreensão sobre o tema disposto é relativamente ignorada pelos homens, pois não convivem com fluxo menstrual, que é como se a mulher adoecesse uma vez por mês. Nada agradável, mas é fruto da mãe natureza e assim que precisamos sobreviver, respeitando nossas mulheres e cobrando do Poder Público providências para maior acessibilidade à dignidade humana, enxergando a pobreza menstrual como algo fácil de ser resolvido.
O cuidado das mulheres, seja nas escolas ou no trabalho, implica em mais produção e mais efetividade em suas atividades profissionais. Não se trata de um mero e simples gasto do governo, mas, sim, de um investimento no bem-estar e no crescimento econômico.
Mas Bolsonaro vetou… Por que vetou?
Jair Bolsonaro (sem partido) vetou o dispositivo legal que garante a distribuição gratuita de absorventes para mulheres de baixa renda, medida que estava prevista no Projeto de Lei 4968, de 2019, aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.
Publicou-se no Diário Oficial da União (quinta-feira, 07 outubro 2021): o presidente sancionou a criação de um Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual com uma “estratégia” para a “promoção da saúde e atenção à higiene feminina”.
Segundo o que foi aprovado, o programa será integrado entre os entes federados e haverá a implementação de “campanhas informativas e de conscientização da população acerca da importância do tema”.
No entanto, foram vetados os dispositivos que diziam respeito ao público-alvo do projeto e aos meios de acesso aos itens de higiene pessoal previstos.
Não alongando o texto, poderemos notar que a visão deturpada de uma sociedade machista em que a mulher é tratada como cidadã de segundo plano, até com relação a sua atenção com a saúde, deixa evidente que estamos nos desviando por caminhos cada vez mais distante da justiça social e da igualdade entre os homens e as mulheres.
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José Osmir Bertazzoni, jornalista, advogado