Rodolfo Capler
Um dos aspectos marcantes, encontrados nas constituições francesas de 1791, 1793 e 1795 e também na Constituição Mexicana de 1917 e na Constituição de Weimar de 1919 é o acesso à instrução como um direito fundamental. Tais constituições lançaram as bases daquilo que viria a ser conhecido como Estado de Bem-Estar Social.
O entendimento de que seus cidadãos tinham o direito à instrução gratuita, refletiu, antes disso, na moldura do ordenamento jurídico-constitucional dos chamados Estados modernos. Em 1948, quando do encontro das Nações Unidas para a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o acesso gratuito à instrução foi afirmado como um direito fundamental e inviolável de toda pessoa humana, ficando prescrito no parágrafo 26 do documento.
No Brasil, apenas na década de 1990, em decorrência da positivação dos direitos de terceira geração na Constituição Cidadã de 1988, o acesso à escolarização foi universalizado. Em contrapartida, ainda enfrentamos baixos índices de aprendizagem em disciplinas fundamentais como matemática, física e português e nos deparamos com o “gargalo do ensino médio” brasileiro, que é o abandono escolar no ensino médio.
Segundo um estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 30,7 % dos jovens de 15 a 17 anos estão atrasados ou fora da escola. Essa triste realidade se dá pelo descaso e ineficiência do Estado em prover educação e condições de acesso à instrução aos seus cidadãos.
A negação do direito à instrução pelo Estado brasileiro é encampada na atual conjuntura. Com a pandemia da COVID-19 e o estabelecimento de medidas protetivas de segurança, como o isolamento social, milhões de crianças e de adolescentes foram privados de aulas no ambiente escolar formal. Mesmo com as ofertas de aulas on-line à distância, o chamado “ensino remoto”, o direito à instrução tem sido negado à população, pois, na maior parte dos lares brasileiros, não há acesso à Internet de qualidade e aos aparelhos tecnológicos, o que incapacita a maior parte dos estudantes de participar das aulas ofertadas em ambiente virtual.
Diante de tal conjuntura, urge (como membros da sociedade civil), protestarmos contra a negação e a violação do fundamental direito à educação que tem sido perpetrada pelo Estado brasileiro. A construção histórica dos direitos humanos, que inclui o direito à instrução, custou o sangue de muita gente. Não podemos nos omitir e aceitar, silenciosamente, a perpetuação de mais uma necropolítica em nossa nação.
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Rodolfo Capler, pesquisador, teólogo e escritor