Entre drogas e poder: como os EUA atuam na América do Sul e impactam o Brasil

 

Dorgival Henrique

 

Nos últimos meses, os Estados Unidos ampliaram sua presença militar e de inteligência na América do Sul, alegando atuar contra o narcotráfico. Mas a movimentação de tropas, a presença de um porta-aviões no Caribe e ações secretas da CIA na Venezuela mostram que há muito mais em jogo do que o combate às drogas.

Sob o comando de Donald Trump, o discurso de segurança continental voltou a ser usado como instrumento político. O objetivo real é reforçar a influência dos EUA na região, em meio à disputa global por recursos estratégicos e alianças internacionais. Isso traz risco direto à estabilidade da América do Sul e pressiona o Brasil a se alinhar a interesses que não são os seus.

Interesses políticos disfarçados: Embora apresentadas como medidas de combate ao tráfico, essas operações têm claro viés político. Trump já defendeu o uso de “qualquer meio necessário” para “restaurar a democracia” na região — frase que pode ser interpretada como ameaça a governos que não seguem sua agenda.

No Brasil, esse discurso encontra eco em figuras como o senador Flávio Bolsonaro, que defendeu ações conjuntas com os EUA em solo sul-americano. Tal postura relativiza a soberania nacional e normaliza a ideia de “cooperação militar” sob comando externo.

O deputado Eduardo Bolsonaro reforça essa aproximação ao participar de eventos e fóruns nos EUA, mantendo laços com Trump e a extrema-direita americana. Essa rede busca fortalecer o bolsonarismo e influenciar a política interna, inclusive em meio às investigações que atingem o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Essas ações configuram uma interferência indireta, em que interesses estrangeiros são defendidos por atores internos, enfraquecendo a capacidade do Brasil de decidir sobre seu próprio destino.

O que realmente está em jogo: Historicamente, os EUA usam justificativas morais — “combate à corrupção”, “defesa da democracia”, “guerra às drogas” — para proteger interesses econômicos. Hoje, os recursos naturais da América do Sul estão no centro das atenções: petróleo da Venezuela, gás da Bolívia, lítio da Argentina e o agronegócio brasileiro.

A presença militar visa controlar rotas comerciais e suprimentos estratégicos, essenciais para a economia global. A América do Sul volta a ser tratada como área de vigilância, e não como parceira soberana.

O desafio brasileiro: O Brasil precisa agir com independência e firmeza diplomática. Apoiar a militarização imposta pelos EUA significaria abrir mão da política externa equilibrada e prestigiosa conquistada nas últimas décadas.

A história mostra que ceder à pressão externa reduz autonomia e enfraquece conquistas sociais. Soberania não é conceito abstrato: é a capacidade de decidir, proteger e priorizar os interesses nacionais.

Caminhos para a região: O combate ao tráfico deve ser feito de forma cooperada entre países sul-americanos, com base em políticas sociais, educação, emprego e inteligência integrada.

Navios de guerra e operações militares externas não resolvem o problema. Pelo contrário, aumentam a violência e justificam novas intervenções. Investir em inclusão e oportunidades é a forma mais eficaz de reduzir a criminalidade.

A ofensiva dos EUA na América do Sul, combinada ao apoio de políticos brasileiros alinhados a Trump, como Flávio e Eduardo Bolsonaro, representa uma ameaça à soberania e à democracia.

Defender o Brasil não é contrário ao combate ao crime, mas sim recusar que interesses externos guiem nossas decisões. O país deve agir com firmeza, preservar sua autonomia e reafirmar o compromisso com a Constituição e com a paz regional.

Em um mundo polarizado, a independência do Brasil é seu maior patrimônio — e cabe a todos os democratas defendê-la.

 

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Dorgival Henrique, Bacharel em Direito, Mestre em Administração, ex-Diretor da FGN – Unimep, Diretor-Presidente do IPEDD

 

 

 

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