Desmistificando a hipocrisia da melhor idade

Luiz Horácio Raposo Borges de Moraes

 

Talvez, se tivesse a sorte de 0,0000000049 da população brasileira, atualmente estimada em pouco mais de 203 milhões de habitantes, em poder viajar, em um ano, para mais de vinte países, casar-se com uma mulher vinte anos mais jovem, receber proventos mensais superiores a 70 mil reais e ser o Chefe de Estado de uma nação continental, aí talvez pudesse considerar esta, minha “melhor idade”.

Mas, segundo estimativa do mesmo Instituto, temos nos dias de hoje, em nosso país, mais de 32 milhões de idosos e posso garantir que a esmagadora maioria dos brasileiros nessa faixa etária não tem essa percepção de “melhor idade”.

A velhice, ao longo do tempo, foi caracterizada de diversas formas, variando principalmente pela época, localização e cultura do povo.

Segundo Delbert (1999) “…a partir da segunda metade do século XIX a velhice é tratada como uma etapa da vida caracterizada pela decadência física e ausência de papéis sociais”.

A ideia dominante na cultura ocidental capitalista era a de que o velho fosse um cidadão improdutivo, sendo a aposentadoria, o “marco” dessa passagem, uma vez que aposentar nada mais é que retirar-se para os aposentos, ação que coaduna com a percepção de inatividade, ócio e pobreza.

Antes ignorados e agora socialmente desvalorizados. Essa era a situação dos idosos no início do século XX, uma vez que a força de trabalho, motriz do capitalismo, excluía-os. Contudo, a criação das aposentadorias e pensões, além do surgimento de disciplinas médicas voltadas para o estudo do corpo envelhecido dão novo significado à velhice, reintroduzindo-os no cenário social e criando um tímido nicho de mercado, com produtos e serviços voltados para esse público.

Na segunda metade do século passado, na Europa, começa definitivamente a ruir o paradigma de que a velhice é a fase da vida humana na qual o ser é improdutivo, desprovido de status social e caracterizado por limitações físicas e deficiências mentais: primeiro com a criação na França, das Universités du Troisième Age e a seguir na Inglaterra, com o advento das Universities of Third Age, ou seja, as universidades da terceira idade, passando a se referir ao idoso como um agente ativo e produtivo, tanto que a própria ONU (Organização das Nações Unidas) denominou o período de 1975 a 2025 como a “Era do Envelhecimento” devido a longevidade da população mundial.

Certo é que categorizar o idoso, naturalizar a velhice ou buscar o politicamente correto, muitas vezes valendo-se de eufemismos, não mudará o fato de que a ampliação do mercado de trabalho, as dificuldades de reposição de mão de obra qualificada por força de trabalho jovem, em razão de peculiaridades profissionais, e a existência de um novo perfil de consumo focado no público longevo, faz nascer uma nova classificação social composta por idosos produtivos, duráveis, com poder aquisitivo e ativos em suas comunidades.

Descabida então, mostra-se a necessidade de se rotular esse estágio da vida do ser humano entre melhor ou pior idade, quer pelos meios de comunicação ou por interesses econômicos que em grande parte apenas visam ganhar-lhes a simpatia por meio de ações aparentemente afirmativas, objetivando tê-los como clientes consumidores, destinando-lhes partes dos vencimentos ou aposentadorias, fato facilmente comprovado pela enxurrada de “oportunidades” ofertadas em telemarketing aos idosos.

Contrariar o imaginário popular rompendo o anacronismo da nossa sociedade é o atual desafio.

Terceira idade, idoso, longevo, velho, 60+, enfim, seja qual for o termo usado, quando revestido de respeito, cordialidade, afeto e empatia será bem aceito por esse público vivido e experiente, que rejeita eufemismos e infantilizações para tentar conectá-los ao mundo em que vivemos.

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Luiz Horácio Raposo Borges de Moraes, mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, bacharel em Administração, Coronel veterano da PM, pós-graduado em Qualidade e Produtividade, pós-graduando em Saúde do Idoso e Gerontologia e sócio proprietário da Third Care Cuidadores

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