José Maria Teixeira
A Lei de Cotas corre sério perigo como um instrumento capaz de contribuir fortemente na quebra de estruturas do racismo. Como estratégia podem conceder lhe a continuidade. Porém, recheada de reparos que suprimem sua eficiência no decorrer do tempo. Esta alerta não é aleatória.
Atentem à pesquisa da ABPN (Associação Brasileira de Pesquisadores Negros), obtida com exclusividade pelo UOL, mostra que das 67 proposições que pretendem alterar a lei no Congresso Nacional, 31 podem prejudicar direta ou indiretamente a reserva de vagas para negros, 20 ampliam direitos garantidos pela legislação vigente e 16 são consideradas “neutras”, por abordarem temas como programas de assistência financeira para universitários cotistas e pós-graduandos – sem entrar no mérito da oferta de vagas.
O perigo é real. Ocorre que de 2018 a 2022 o Brasil passou a sofrer de forma aberta ameaças e ataques contra a Democracia. O governo de então, inoculado pela ideologia nazifascista, portanto, autoritário, dizia agir dentro das quatro linhas, isto é, obedecendo a Constituição. Porém, mentia destruindo a Constituição apoiado por vários deputados e senadores e grupos populares formados por ele, tendo como resultado o 08/01/2023 ataque frustrado contra a Democracia, na cede dos três poderes em Brasília. Isso tudo não acabou. Esses grupos ai persistem além de deputados e senadores que assim pensam e agem contra a Constituição dizendo ser constitucionais.
Então, o que é constitucional?
Este é um conceito de fácil entendimento. Constitucional é tudo aquilo a que se ajusta, tudo aquilo pelo que se organiza e ordena a vida do homem em sociedade sob a injunção de uma lei maior. Trata-se aqui da Constituição que se assenta na natureza do ser humano e por isso se legitima. Ela é, pois, a bússola sagrada pela sua formação mesmo porque nasce de uma Assembleia Nacional Constituinte. A do Brasil, com sobeja razão batizada em 1988 de Constituição Cidadã. Na verdade, está pelo conjunto da obra nada ou quase nada deixou a desejar. Por certo as reflexões históricas e científicas revelaram ao entendimento dos constituintes em Assembleia a dimensão do ser humano. Isto é, ele não é pura exterioridade. A cada dia mais a Ciência e a reflexão revelam-no e o confirmam como um ser dotado de uma interioridade diretiva ordenadora de seu destino. Isto é, o homem é chamado à existência para viver e conviver. Esta verdade é inquestionavelmente demonstrada nos longos e intrincados processo de evolução. Cosmogenese é a área que estuda a origem e o desenvolvimento do mundo. Biogenese estuda a origem e desenvolvimento da vida. A homogênese estuda o homem, a reprodução em que as gerações se sucedem sempre pelo mesmo processo sem que haja mudança. A este homem que ai está dotado de inteligência, liberdade e vontade importa a retidão de seus atos na relação com seus iguais, em busca de sua realização. A propósito, leia-o quem não ouviu o discurso do atual presidente da Câmara Federal ao colocar em votação o projeto da reforma tributária da nação brasileira.
Ainda que num momento de lucidez política concitou os parlamentares sem constrangê-los. Portanto, independente de siglas, partidos ou tendências a votarem positivamente por se tratar de um projeto do interesse da nação brasileira, o Brasil.
Nesta linha de pensar, julgar e agir é que se pergunta o que é constitucional? Como já se disse este é um conceito de fácil entendimento. Mas, porém, todavia, contudo, não é de fácil aceitação. Pois a cada direito corresponde um dever. É esta relação acolhida geradora da harmonia social de irmãos entre irmãos e que num contexto maior permite que se possa falar em Estado Democrático de Direito como se sequer o Brasil. A questão não é o direito e sim o dever.
É crucial pois entender o que é o ser constitucional ao se discutir e decidir sobre a continuidade da Lei de Cotas racial e social pelos parlamentares brasileiros.
Art. 205: “A educação é direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Este artigo acima citado da Constituição Brasileira entre outros, mostra que ela extrapola a formalidade. impede o entendimento da lei Maior não apenas e tão somente sob o aspecto formal. Ela exige pois medidas praticas para o seu efetivo cumprimento. E isso é ser constitucional: criar e usar meios lícitos para levar a efeito o cumprimento da Lei Maior, segundo a Lei Maior. Constitucional é, pois, tudo o que a esse fim se prestar. Assim compreendido a Lei de Cotas do Brasil é indiscutivelmente constitucional. E mais sob esse aspecto ela seria em qualquer pais do mundo onde a pessoa humana seja respeitada segundo sua natureza, isto é, como sujeito de direitos e deveres, dotado de inteligência e vontade livre. Deve continuar.
No entanto, em que pese a clareza do que é ser constitucional e a constitucionalidade patente da Lei de Cotas há os que deliberadamente a contestam. Uns por ignorância. Estes não sabem o que tem obrigação de saber. Outros por se considerarem superiores no que se equivalem.
Dado o decidir a continuidade ou não da Lei de Cotas pelo Congresso Nacional brasileiro, e ante a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, decretando a inconstitucionalidade de semelhante lei, a pertinência do debate neste caso se impõe:” O que é constitucional” para realçar a constitucionalidade e eficiência da Lei de Cotas sendo melhorada e aprovada sem solução de continuidade, ou seja, sem interrupção.
Porém, atenção. Os nazifascistas perderam as eleições, mas estão ganhando ministérios. E ousam escolher. No momento, preiteiam o mando da PGR (Procuradoria-Geral da República). Desastre anunciado. Acredita-se que não aconteça. Pois, do indicado, Augusto Aras, se diz: “pode ate não entregar, mas vende até a mãe”.
Portanto, é justa a preocupação da sociedade com a Lei de Cotas sob decisão de continuidade ou não pelo Congresso Nacional. Mesmo porque é lá que se encontram e atuam os inoculados com o espírito nazifascista. Estes que cultuam aversão aos negros, aos índios e aos LGBTQIA+ podem só por isso e tão somente por isso votar contra a continuidade da Lei alegando ser ela inconstitucional. Embora sabendo que ela é constitucional. E mais do isso por ter ela demonstrado ser o principal instrumento entre outros capazes de derrubar o racismo estrutural. Isto, porque conforme o mando do artigo 205 da Constituição, não há como promover a educação sem promover o educando. Eles sabem que este é o caminho a seguir para que um dia se possa dizer “somos todos iguais perante a Lei”.
Ademais, os que ainda creem roguem aos deuses que aqueles parlamentares representantes de si mesmos, ainda que contra a vontade votem favoravelmente pela melhora e continuidade da Lei de Cotas que deve continuar.
Mesmo porque o Brasil é uma nação formada por três povos, o povo indígena originário, o povo negro e o europeu que aqui chegaram de navio. Este, nos convés, enquanto aquele, nos porões. E isso não é constitucional.
Por isso, a Lei de Cotas deve continuar.
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José Maria Teixeira, professor.