João Salvador
Neste contexto, o fim da picada é uma metáfora usada para chamar a atenção dos alheios e passivos, diante dos graves transtornos que a dengue pode causar. É inadmissível desdenhar e nada fazer para eliminar os criadouros do
Aedes aegypti, o díptero “perna longa”.
O alvinegro zebrado não dá trégua. De voos rasteiros, sempre atraído pelo dióxido de carbono exalado do solo e dos vasinhos sanguíneos da derme humana. Pousa nos seus hospedeiros de maneira sutil, sem muito alarde e sua picada é quase imperceptível, indolor, com uma leve coceira, na pior das hipóteses, uma erupção cutânea. Por voar baixo, sua decolagem se concentra mais nos pés, pernas e tornozelos.Tem uma boa autonomia de voo, que o permite deslocar para uma relativa distância. Acessa os lugares mais altos, através de elevadores e escadas, de carona em sacolas e na roupa dos que escalam os degraus.
O “capitão do mato” de outrora, hoje possui um título de “cidadão indesejável”, como uma das piores pragas urbanas. Em razão do desmatamento, escolheu o ambiente urbano para zunir, onde encontrou fartas unidades de “hemonúcleos de sucção”. Injeta na derme da vítima sua agulha, com a qual enche sua bolsa de sangue e nutre o seu banco de ovos. Daí, os novos vetores das doenças típicas podem da sequência às arboviroses. Aliou-se aos desleixo dos cidadãos de precário grau de consciência, dando margem a sua proliferação: água contida em pneus, vasos de flores, piscinas sem cloro, casa sem ocupação ou em construção, a falta de limpeza de caixas d’água, das calhas entupidas e do desleixo com o quintal.
Depois da desova, as fêmeas, na fase adulta, quando contaminadas, continuam a disseminar, além da dengue, os vírus da zika, chikungunya e o da febre amarela urbana. Os ovos do mosquito podem resistir a um longo período de aridez e o seu transporte, para os lugares mais longínquos, se faz pela impregnação dos ovos nos materiais transportados.
Pelas notificações sobre a dengue em Piracicaba, a boa notícia é que houve uma redução nos casos nos últimos dois anos, mas a prevenção deve ser implacável o ano todo, independente da estação. Nas medidas de controle, repercutidas na imprensa, também fornecidas pelos agentes da secretaria da Saúde, pedem que cada um faça a sua parte. Em um ambiente de zunidos não se resolve no tapa, nem com uma cortina de fumaça, mas com protetores e a aspersão de inseticidas seguros.
Sem larvas não tem mosquito e sem mosquito não tem dengue. Portanto, elimine os criadouros e peçam aos seus vizinhos que também o façam. Uma picadinha não dói, mas a seringa de absorção sanguínea desse hematófago, pode trazer consequências gravíssimas, como desidratação grave, problemas no fígado, no coração, neurológicos e/ou respiratórios e a dengue hemorrágica. Mas, o pior de todos os sintomas é, indubitavelmente, a possibilidade de um “dengoso” ir a óbito.
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João Salvador é biólogo e articulista