Fora da nossa casa

Antonio Lara

 

Mahatma Gandhi não precisava de apresentação. Querendo identificar-se com os pobres e excluídos da Índia, ele usava uma simples tanga. Aos poucos, o governo inglês foi obrigado a reconhecer a autoridade dele perante o povo e, depois de prendê-lo inúmeras vezes, começou a tratá-lo com respeito. Certa vez, ele foi convidado para uma festa na casa do governador inglês. Ghandi chegou com a roupa costumeira: na prática nada mais do que um lençol. Por estar assim vestido, os encarregados da portaria não deixaram entrar. Ele voltou para casa e, imediatamente, enviou um pacote ao governador. Dentro tinha um terno. Ao receber o embrulho, o governador ligou para ele querendo saber o tinha acontecido. Ghandi respondeu: _ Fui convidado para a sua festa, mas não me deixaram entrar por causa da minha roupa. Se for a vestimenta que vale, o meu terno tem mais direito de entrar do que eu!
Uma lição também para nós. Quantas vezes olhamos mais para a roupa dos outros – se são bem vestido ou não – que pelas próprias pessoas. Apesar de saber que as aparências enganam, continuamos a ser vaidosos e a acreditar mais naqueles que se apresentam bonitos, bem vestidos e sempre sorrindo. Desse jeito, quem não tem roupa chique, quem não se encaixa nos padrões de beleza na moda e não tem como fingir de sorrir pelas dificuldades que está vivendo acaba se envergonhando da sua situação. Se é assim que funciona a sociedade e a nossa convivência, é o caso de nos perguntarmos se não está acontecendo algo errado. A alegria de nos apresentarmos e de nos encontrarmos como somos, de verdade, está desaparecendo para transformar a nossa convivência social num desfile de aparências e superficialidades.
Pode ser que eu esteja exagerando, mas, no evangelho, Jesus envia os seus discípulos em missão de recursos, na maior simplicidade e liberdade. Por quê? Vamos lembrar que o Senhor Jesus primeiro reuniu um grupo de seguidores, chamando-os de lugares e ambientes diferentes; depois escolheu os “doze” para que estivessem com ele e, enfim, os envia em missão, dois a dois. A boa noticia do Reino não é para um grupo de privilegiados ou eleitos: é para todos os que estiverem dispostos a acolhê-la.
No entanto a boa noticia, afinal, é o próprio Jesus. Com ele já começa o Reino de Deus e é nele que os seus seguidores têm que acreditar. Os apóstolos enviados não têm outra novidade para comunicar a não ser aquele que Deus se fez tão próximo da humanidade ao ponto de ser também “humano”, visível e com as limitações de toda criatura. Portanto se, no homem Jesus, Deus se fez pequeno, pobre, mortal, não pode ser diferente para os seus enviados. Se eles chegassem com riquezas, com meios poderosos, poderiam corromper a pureza e a sinceridade do Evangelho, poderiam “comprar” as consciências. Faltaria a liberdade de acolher, só por amor e n ao por interesse, aquele Jesus que veio para nos reconciliar com um Deus Pai de todos e que nos quer irmãos, porque somos todos filhos muito amados por Ele.
A fé não pode ser o resultado de uma negociação numa troca de favores, de bens ou de dinheiro. A pobreza dos missionários garante a sinceridade deles e a liberdade de quem pode ou não acolhe-los. O que está em jogo não são os enviados, mas aquele que os enviou: Jesus. Ele é Filho, o dom do Pai, oferecido por amor e, por sua vez, dará a sua vida também por amor. Este amor divino é o único e inestimável tesouro que os missionários foram enviados a oferecer. De outra forma, o Evangelho seria misturado ou confundido com dinheiro, túnicas, comida. Em lugar do essencial, as aparências; em lugar de Deus, os enfeites humanos. Até quando ficaremos encantados com o brilho das nossas vaidades, os vestidos continuarão a ter mais valor que as pessoas? Desta vez, porém, será o próprio Senhor Jesus a ficar fora da nossa casa.
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Antonio Lara, articulista; [email protected]

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